A primeira semana é a pior que existe. De uma pessoa normal você passa a ser emocionalmente desequilibrada. Não ter cigarro por perto é quase pior que a ideia de não fumá-lo. Não consegue trabalhar não consegue comer não consegue dormir porque todo e qualquer pensamento passa a ser o cigarro.
Você se olha no espelho e já não se reconhece mais. Maquiagem nem pensar, qualquer vestígio de otimismo te deixa irritada e de mau humor é tudo que você quer se alimentar. Parece que nunca vai ter fim.
Parece que a dor nunca vai embora.
Largo a revista no ponto de ônibus e resolvo ir a pé para dar tempo de secar as lágrimas. Não acredito que acabei de ler um depoimento de uma ex-fumante e me identifiquei com cada palavra.
E eu nem mesmo fumo.
Talvez você seja o meu cigarro.
Acordei sem vontade, tomei banho sem vontade, café da manhã sem vontade e saí sem vontade. A ideia de trabalhar doente assim me assusta, mas a ideia de ficar em casa pensando em você assusta muito mais. Preciso me distrair. A revista não serviu, ouvir música não serviu, trabalhar vai ser diferente.
Tem que ser.
Não posso parar. Tropeço na calçada e penso na sua boca encostando na minha. Apresso o passo e aumento a música no volume máximo. Um cara passa de bicicleta bem rápido quase esbarra em mim e eu me lembro do jeito que você respira quando a gente dormia juntos. Não, próximo assunto. Pensa na sua avó. Pensa nas crianças. Pensa no palhaço que te assustava quando você era mais nova. Sua boca ainda deslizando sobre mim.
Eu sei que vai passar. Lá no fundo eu sei que vai passar. Um dia eu vou te esquecer, Thiago. Um dia vou parar de entrar no whatsapp para ver a última vez que você entrou, parar de olhar para nossa foto e vou chegar cansada do trabalho me jogar no sofá e não sentir a sua falta.
Eu sinto saudade desse dia que ainda nem aconteceu. Eu sinto sua falta.
Hoje precisei falar com 6 pessoas aleatórias para substituir todos os assuntos que surgiram no decorrer do dia e eu senti vontade de te dizer. Nenhuma delas era você. Nenhuma das conversas me entreteu.
Hoje é o meu primeiro dia sem você. A dor é imensa agora, mas vai passar. Como diria Scarlet O’Hara: Tomorrow is another day.
Talvez você seja o meu cigarro.
Tanto faz, hoje eu parei de fumar.
[*Cap. 14 do livro CARMEN!, por Marina Bonafé. O texto original encontra-se aqui.]
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