[Você pode ler este texto ao som de Baby (dos Mutantes, não do Bieber)]
Encontrei enquanto batia um papo no barzinho da esquina esperando o trânsito passar pra voltar pra casa mais rápido. Enquanto a aula tava chata e ele me pedia companhia pra escrever sobre o Caetano, mas eu gostava mesmo era do Chico. Tentei explicar isso pra ele e ele me entendeu, num momento terno, quando rabiscou no meu braço um trechinho de Caetano pra me provar que era dele essa coisa calma de ser.
Ele era bossa nova e eu era um furacão. Idealmente ele se perderia na minha loucura que não se pronuncia de uma hora pra outra, mas vai anunciando a tempestade aos poucos, dando indícios do mau tempo, mostrando a que veio no dia a dia. E foi assim que eu descobri, quando chegava em casa do trabalho, que a minha companhia não era o Maltês que a minha mãe tinha me dado pra não me sentir sozinho na cidade nova. A minha companhia era ele e o trecho dele, aquela coisa meio arrastada que nem dava pra perceber debaixo dos caracóis que ele cantava. E se eu pudesse mudar os trechos hoje em dia, eu diria que já sabia que o meu corpo combinava com o jeito dele.
Ele dizia que morria de medo do mar, mas eu vim de lá. Toda onda era desafio e foi aí que eu entendi o recado. Que o rapaz do interior tinha se encontrado com o moço da praia, ambos tentando encontrar alguma coisa no meio do concreto, no meio de um bando de coisa que a gente ainda não sabia que precisava e que existia. Gravei no braço dele outro trecho, uma referência menos brasileira e mais de coração. E eu nunca soube de verdade, mas acho que ele entendeu quando eu disse que o acompanharia através do escuro. Entendeu tanto que apagou a luz e tocou Mutantes.
Ele era alto e eu talvez passasse um pouco mais do ombro dele. Mas a gente conseguia se divertir do Oiapoque ao Chuí, mesmo a gente sendo uma versão alternativa do Eduardo e da Mônica, mesmo que pistache e maracujá nem combinassem tanto, a gente tomava sorvete do mesmo jeito. Sou de Áries e eu achava que ele era de Leão, mas não, ele era um mistério desses que mistura o zodíaco inteiro e a cada dia mostra um lado diferente. Incoerência bonita a dele. Todo mundo poderia jurar que eu era ficção e ele era fantasia, mas nessas comparações a vida se esquece de mencionar os acasos que deixam a gente na mesma rota de colisão.
E foi assim que eu descobri as coisas que ele ainda não sabe. A gente sempre descobre e sabe quando um grande amor chega, desses que a gente sonha pra vida e que de vez em quando encontra. Enquanto a gente se fez trecho, a composição foi sendo marcada na melodia. Ele ainda não sabe, mas agora o trecho é outro. Simples, claro e recita a minha música preferida dizendo “Baby, I love you”.