O que eu amei foi uma projeção sua


[Você pode ler esse texto ao som de Love me anyway]

Acho que uma das grandes frustrações da minha vida foi nunca ter te beijado. Na verdade, acho que o ideal seria dizer que a frustração existe por você nunca ter me beijado, já que eu queria. Eu queria ter feito tanta coisa nessa corpo que você chama de casa, mas não deu, você tava ocupando alugando os cômodos todos, um pra cada cara diferente que morava no Rio de Janeiro, em Goiás ou em qualquer lugar que não fosse o meu.

Eu me encantava muito fácil, sabe? Você tinha todo aquele jeito de comédia romântica improvável que eu gostava nos meus vinte e poucos anos, então eu achei que seria uma boa ideia investir em construir você. Construir, sim. A figura que eu tenho não é de um cara que eu amei profundamente através de vivências reais e dolorosas de uma relação que não foi pra frente. Foi tudo fruto da minha cabeça: um rapaz bonitinho e cheio das boas histórias cruzando a Avenida Faria Lima e me chamando pra tomar um café à meia noite em vez de dormir, anunciando aos quatro ventos que tava se mudando e que não teria tempo pra amar. O que você quis dizer é que não teria tempo para me amar. Nem naquele dia nem nunca. Hoje eu consigo ver isso. Hoje eu consigo te ver dançando e olhando pras escadas procurando um corpo que também não é o meu para dormir contigo.

Sinto que só tirei o ônus da gente. Fiquei com um peso enorme das coisas que nunca se realizaram, mas eu gostava disso. Só depois de três anos de terapia foi que eu entendi que as pessoas gostam de ter controle sobre as fantasias delas, mesmo que doa. O mundo real é complicado e a gente curte essa coisa de projetar, planejar, tirar as próprias conclusões sobre episódios que nunca aconteceram de verdade e os sinais que aquilo nos mostra. A gente não gosta da verdade, da rejeição explícita em todas as vezes que você disse que não gostava de mim e eu preferi rir, fingindo que era o seu jeito covarde de fugir de um amor porque não tava pronto. Você tava pronto o tempo todo, só não tava pronto pra mim.

As pessoas fazem isso, não fazem? Fingem que ouviram errado, fingem que um não pode significar um talvez. Mas a negativa é tão real quanto todos os “eu não te amo” que você me disse nas entrelinhas quando contava do Pedro que cozinhava e cantava enquanto você beijava o pescoço dele ou do Antônio que ainda te espera numa esquina com umas flores bonitas que você não aceitou ou o Lucas que apareceu na sua casa às quatro pra deitar com você. Todos esses homens tiveram o corpo que eu desejei, o beijo que eu não tive. E eu os invejei, viu? Invejei cada homem que pôde ter um pouco do que eu nunca estive perto de ter.

Ainda bem que passa. Ainda bem que a análise traz diagnósticos fantásticos sobre como a nossa mente fantasia amores que não passaram de tesão e algum tipo de masturbação sentimental mútua porque a gente era carente demais. Ainda bem que dá pra descascar a projeção e perceber que o esqueleto não era tão interessante assim, que eu sofri à toa. Ainda bem que o convívio bate à porta e mostra que aquilo não era amor, era qualquer coisa doentia que eu mantinha porque eu te queria de um jeito mesquinho. E tudo bem. Eu já fiz muito isso, já perdi as contas de quantos homens eu jurei amar até perceber que eu só amava a ideia que tinha deles, a fantasia de quem eles poderiam se tornar comigo sem nunca ter preenchido ou conhecido frequentado realizado o desejo árduo de habitar as suas peles.

Você sabia que eu escrevi um livro novo? Ele se chama “O que eu tô fazendo da minha vida?” e fala sobre como a gente precisa enfrentar os nossos demônios interiores para tentar curar os problemas que nos impedem de seguir em frente no amor, na família, na carreira e em qualquer outro lugar de crise. Ele também fala um pouco sobre o período de depressão e das crises de ansiedade que tive, dos traumas e dos aprendizados que a terapia me trouxe e tudo mais. Se você quiser saber mais sobre ele, é só clicar aqui para ler mais e comprá-lo com desconto: O que eu tô fazendo da minha vida?


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