[Você pode ler este texto ao som de Youth]
Você não gosta de mim. Gosta é das mãos nas costas que sobem e marcam e seguram o seu pescoço pra dentro da cama enquanto eu caio. Gosta dos filmes que eu alugava e das histórias dos filmes que a gente precisava ver no final de semana antes que se passassem as 48h da devolução. Gosta é do café com canela e do bolo de fubá que acordam na minha mesa antes de você sair da minha cama e beijar minha boca com a pasta de dente.
Você não gosta de mim. Gosta é do meu nome, que começa com uma das cinco primeiras letras do alfabeto e, por isso, fica fácil de selecionar na lista de contatos. E eu recebo as suas mensagens. Mensagens bêbadas e disléxicas e cheias de significado entre um enter e outro que só você não vê. Gosta é de apertar o microfone do mensageiro e contar do teu dia entre um táxi e outro, entre um prédio e outro, entre o meu colo e outro que não tem interesse em ouvir sobre o seu chefe e o seu cachorro e as pessoas que trabalham na sua mesa e a doença que matou uma tia sua na semana passada. Eles não gostam disso.
Você não gosta de mim. Gosta da facilidade com que a minha porta abre às duas ou três, às vezes cinco da manhã, quando você não tem onde deixar o carro e me pede pra usar a garagem, me pede pra descer e subir a rampa porque você não consegue nem deitar no meu sofá sem tirar os sapatos e eu engato a primeira achando que o barulho do motor copia o ritmo do meu coração, mas é mentira. O barulho me acalma, já as palavras que você não diz causam o efeito contrário. E eu não gosto disso.
Você não gosta de mim. Gosta é de papo furado com jeans e sapato sem tirar o lençol da cama porque agora a gente é só amigo. Gosta de lembrar dos dias de vento e dos dias de céu laranja-arroxeado na Praça do Pôr do Sol e da gente cambaleando antes da noite chegar, mas isso não é saudade, não. É porque você gosta de lembranças vazias. Você só tem lembranças vazias. Mas jura que gosta de significados. De gente bacana. De conversa profunda. De seda queimando em Santa Cecília e de uma casa cheia de plantas pra elevar o espírito. De livros empoeirados como o casamento dos seus pais. De encontrar amores e vivê-los tanto que tudo se esgota na cama, na sua, não na minha. Você gosta é disso. Não de outra pessoa. Não de alguém no meu lugar. Não de uma história de amor e que amor é esse que não vive na sua biblioteca nos seus lábios no seu abraço trôpego na porra do manobrista que te abre as portas da casa e da cozinha e do quarto e dos meus lábios no meu abraço sóbrio que já não tem mais lugar pra você. Você gosta é do vazio. Não de mim.
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