Estagiário também é gente


Se tem uma coisa que muito me incomoda nas “brincadeiras” on e offline é a maneira como tratam os erros de algumas empresas. Não sei se você já reparou, mas sempre que algo de errado acontece no mundo digital, jogam a culpa no estagiário. O problema nunca é com quem comanda, com quem dá as cartas, com quem já tem responsabilidade suficiente para lidar com o fluxo de trabalho, mas sempre do estagiário.

Eu já fui estagiário nessa vida. Aliás, acho que quase todo profissional já passou por fases de estagiário e assistente, o que é bem comum em carreiras de longo prazo. Estagiário nada mais é que um estudante querendo aprender na prática de uma empresa as coisas que estuda na faculdade. Você tá lá se matando pra terminar a faculdade (que é de um lado da cidade), fazendo 6 horas de aula por dia e ainda tem que voar pro outro lado da cidade pra mais 6 horas de trabalho em algum lugar que talvez um dia te contrate como efetivo. Você passa uma jornada de 12 horas diárias de trabalho sem contar com o deslocamento para que a maioria das pessoas te veja como alguém inferior ou bobo, pronto pra cometer erros e ser culpado por qualquer coisa que aconteça.

Existe uma cultura muito estranha de inferiorização em torno estagiário – ao mesmo tempo em que se exige muitas habilidades dele. Você já viu como é difícil conseguir um estágio sem experiência? Ou como ele precisa saber duas línguas, três programas digitais e ter habilidades em campos completamente diferentes para entrar numa vaga pequena que não vai chegar perto da remuneração compatível com as habilidades? Coisas que não pedimos pra quem tá começando.

“Tudo bem, todo mundo precisa começar de baixo”. Até hoje essa frase me dá arrepios quando é utilizada de um jeito ruim. Começar de baixo é uma maneira de adquirir experiências, conquistar confiança e desenvolver habilidades com chefes e líderes que possam ensinar alguma coisa. Quando a visão geral é a de “sempre manter por baixo”, a coisa muda de figura. Aquela história de manter o estagiário como um braço de trabalho que não é reconhecido nunca, mesmo que tenha até mais habilidades que outros membros da equipe.

Sempre enxerguei estágio como período de aprendizado. Um momento da vida de todo profissional que precisa começar de algum lugar, botando a mão na massa. Tive estagiários excelentes e muito melhores que colegas de trabalho com “mais experiência”. Tive assistentes mais dedicados que muitos líderes que conheci. Gente que não fez intercâmbio fora do país, que não teve experiência profissional – até porque, cá entre nós, você vai pedir experiência pra quem tá há menos de dois anos na faculdade? -, gente que aprendeu rapidinho porque tinha determinação e vontade de aprender. O estagiário é essa figura relacionado com aprendizado, não um profissional de baixo custo que vai realizar as tarefas diárias de uma empresa com zero reconhecimento. E nem o cara que vai levar a culpa por erros que deveriam ter sido corrigido por seus “todo-poderosos chefes”. No fim do dia, tratar com humanidade e respeito alguém que pode estar no topo daqui a alguns anos é uma questão muito mais importante do que ter repertório pra fazer piadas bobas durante o café da empresa.

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