[Você pode ler esse texto ao som de It’s Over]
Eu amava aeroportos.
Quando eu era pequeno, eles eram coisas grandes e assustadoras e eles transportavam pessoas e as levavam embora e traziam de volta também. Elas choravam nas filas e sorriam e carregavam malas e outros, flores. Às vezes nada.
Eu entrei em um avião pela primeira vez com sete anos. Eu não entendi nada, tinha uma comida mais ou menos, uns barulhos estranhos e uau, estou em cima das nuvens. A vista lá de cima é incrível. Sério, mesmo que você tenha medo de avião, a vista compensa. Eu garanto. Eu odeio altura, mas pouca coisa me traz mais paz do que estar lá em cima, olhando para tudo aqui embaixo sendo tão pequeno. É uma das poucas vezes na vida que se sente que as coisas tem solução: que você pode começar de novo, que o mundo é grande demais e, bem… Podemos ir pra qualquer lugar.
Com o passar do tempo eu comecei a frequentar mais aeroportos: em viagens de trabalho, em viagens de lazer. Comecei a embarcar sozinho. Foi assustador na primeira vez, um pouco menos na segunda. Hoje em dia não estranho mais. Mesmo assim, ainda tem um padrão que se repete toda vez que eu embarco: alguém fica para trás e eu vou.
A sensação de ir é ótima, na maioria das vezes. Você vai e as coisas se modificam, você respira novos ares, você enxerga por cima das nuvens. Mas e quando é você quem fica?
Agora eu odeio aeroportos.
Eu odeio porque significa que alguém está indo embora e eu estou ficando. Eles significam despedidas, e agora eu entendo as pessoas que choram e voltam para trás carregando nada além de lembranças no peito. Eu entendo as bolsas à tiracolo de um lado do corpo, para fazer um contrapeso com a saudade do outro lado do peito.
Eu sempre pensei que a dor da saudade é maior em quem fica. Daqui debaixo, as nuvens são grandes demais, os prédios, os carros, e todos os lugares que te lembram a pessoa que acabou de decolar. Ela está do seu lado no carro enquanto você a leva até a sala de embarque, mas depois que você a perde de vista, você volta para o carro e já não tem mais ninguém.
A vida sempre muda e às vezes você vai ser o avião que vai embora: seja de você mesmo, de alguém ou de algum lugar. Outras vezes, você é quem fica para trás da sala de embarque, vendo alguém que você ama indo embora sem poder ir atrás. Talvez você até se sinta a pista, por onde os aviões pousam e decolam sem perceber as marcas que deixam em você, sem demorar tempo demais para serem importantes, sem se preocupar em vir e ficar.
Mas no fim das contas você precisa ser o céu. Lá os aviões podem ir e vir, passear por você mas você continua inteiro, intacto. Você decide se chove e impede os voos, você decide se deixa o sol entrar e permitir o encontro (ou a separação) dos relacionamentos.
Agora eu amo/odeio aeroportos e eu ainda não decidi qual dos sentimentos pesa mais. Eu sei que não gosto de ficar vendo partir, mas também não posso impedir o voo de ninguém.
Talvez não seja sobre ir, ficar ou permanecer. No fim das contas, talvez seja sobre voar junto, em pistas largas o bastante para permitir ambos os voos.
E talvez não seja sobre você ser o céu. Talvez seja sobre rasgá-lo com alguém.