Talvez tenha chegado o momento de ir embora


Talvez você acorde e julgue ter chegado àquele momento da vida em que a única coisa que deseja é ir embora. Ir embora de tudo: da sua casa que não mais te abriga, daquela faculdade que não mais te entusiasma, daquelas horas intermináveis naquele emprego chato que mal paga a tequila dos finais de semana para esquecer os problemas, daquela academia cheia de gente fútil, daquela rotina maçante, dessa vida que não é a que diretamente escolheu, mas a que indiretamente foi imposta.

E são nesses instantes que você se pega completamente perdido, sem muitas saídas, quiçá chegadas. Você parece ligado no modo automático. Tudo se apresenta como breu e confusão, a única solução que encontra é chorar: chorar por tudo que se perdeu, pelo o que se foi e não volta mais, pelos momentos vividos, sobretudo pelos não vividos, por todas as quedas e tropeços, por todos os poços úmidos e lamacentos que habitou durante dias a fio sem nenhuma salvação, por todas as mortes diárias de você mesmo. É tão estranho pensar que se morre diversas vezes enquanto se está vivo. Viver é tão difícil, meu amor, e eu tenho medo de ter desaprendido tanta coisa importante e que vai morrendo aos poucos quando a gente também morre um pouco a cada decepção ou frustração.

Cansado, chegarás o dia em que terás vontade de fugir para bem longe, para que todos sintam a sua falta, para que você sinta a sua própria falta. No silêncio da madrugada, arrumarás as malas escondido de todos, colocarás as roupas básicas nas cores pretas e brancas, algum casaco e lenço, seu cordão com sua pedra da sorte, o maço de cigarros, uma garrafa de água e alguns biscoitos para sobreviver durante a viagem. Deixará um bilhete escrito para sua mãe: “querida mamãe, eu precisei ir embora. Não sei preocupe, hei de ficar bem. Volto quando me encontrar, mas te ligo toda noite para te deixar um beijo. Com amor”.

E prontamente se colocarás a ir embora, não importa para onde, qualquer lugar onde possa começar tudo de novo, fazer tudo outra vez; onde conheça gente nova e talvez encontre seu futuro amor; em que possa decore sua própria casa e ter sua horta no jardim; em que possa fumar no meio da sala sem ninguém reclamar do cinza no ar e do cheiro forte; em que, no meio da noite, resolva fazer um bolo de cenoura e cobertura de chocolate só para passar o tempo; que resolva repentinamente receber os amigos para uma festa do pijama; que possa se sentir livre como nunca se sentiu.

Com sorriso no rosto, não sentirás mais inveja do pássaro que migra no inverno, porque o frio do teu peito já passou. Você se descobre novo e outro.  E depois pensa com orgulho de si que a melhor coisa que fez foi dar um passo em direção à porta e que, acredite, nem toda separação é ruim. Algumas, pelo contrário, são necessárias para o crescimento. Repetirás em voz alta todas as manhãs ao acordar: nunca mais, por mais cômodo que seja, ficar em jaulas que sufocam, relacionamentos que amordaçam, casas sem janelas, e sem uma dose de amor próprio para recomeçar.

 

 

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