[Você pode ler este texto ao som de Ela só quer paz]
Ela é o iogurte de banana com aveia que abre o meu dia, cartão-postal de uma vida mais saudável sem balança nem colesterol alto. É o filme de quarta à noite depois do trabalho, quase babando no travesseiro enquanto sinto mãos passeando pelos meus cabelos e pelos pelos no peito. Ela é o vinil que eu nunca comprei porque faltava vitrola, e hoje em dia eu ouço música, danço pelos corredores rodopiando como se tivesse formação em balé, fico na ponta dos dedos pra parecer mais alto e viro a noite cantando com um violão. Ela é.
Ela é a viagem que eu não fiz – e me arrependo até hoje. Vi que distância é um bicho peçonhento que não dá só em casa de barro, dá em coração de pedra e cabeça dura também. Vi que saudades não combinam com ela. No dicionário, ela não é nada daquilo que você imagina. Ela é um pouco de calma segurando a minha mão quando eu achava que iria vomitar e passar mal pro resto da vida num barco em alto-mar. Ela é o riso que provoca, é meu jogo voraz. Ela é meu contato de emergência até pra atravessar a rua. Se algo der errado, liguem pra ela. Se algo der certo, deixa que eu ligo pra contar. Deixa que eu ligo.
Ela é o livro que eu não termino nunca, mas já é o meu sucesso de vendas, meu mais vendido. Ninguém leu ainda, e nem sei se quero que leiam. Deixa as folhas em branco pra ela completar, deixas as listas vazias pra ela preencher, deixa um espaço no peito que é só dela. Ela é o bilhetinho que eu mandei na segunda série pra alguma outra que não era ela, ela é a cartinha da quinta que foi confiscada pela professora, é o presente que eu comprei e não dei. Ela é aquela prece que eu fiz na igreja, parça, e mesmo que eu não tenha religião eu sei que é ela.
Ela é meu jeans rasgado e minha bota nova, ela é todo o meu jeito de vestir. E eu sou mais ela do que já fui qualquer outra mulher na vida, parafraseando a Tati Bernardi. Ela é o jeito como eu olho, minha promessa de dedo mindinho. Não tem ninguém que me atravesse tanto, tem ninguém que me ponha de quatro feito um bebê que não aprendeu a andar ainda. Ela me mostra que eu só engatinho, que eu tô longe de saber muita coisa da vida. Ela me ensina e eu juro que aprendo, mesmo entendendo nada do que ela diz porque não dá pra tirar os olhos dos olhos dela. Já sei tudo de leitura labial, de braile e um pouco de amor também. O resto eu pego no caminho, o resto eu pego com ela até a hora que ela quiser ficar por aqui. E eu espero que ela seja tudo menos despedida. Espero que ela seja tudo. E ela é.
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