[Você pode ouvir essa música ao som de Pra Fuder]
Boto a cara pra fora do carro, sinto o vento roçando com carinho acima dos cem quilômetros por hora. Meu telefone toca, não atendo, deve ser a mãe mandando ir devagar. A estrada é reta, é fácil manter os olhos fechados por algum segundo, sinto o risco de morrer numa colisão de frente. Foda-se.
É exatamente essa a sensação de liberdade que eu preciso. Gosto da palpitação, do tal brado retumbante no peito, do samba alto estourando a caixa de som. Eu uso sinto de segurança pra tudo, usei tanto sinto que sou só marcas. Sou contida. Tudo me contém, tudo me faz ficar dentro de mim. Como é que se cala quem tem troveja? Não dá. Uma hora a gente faz barulho, uma hora a gente acaba estrondando feito raio certeiro em árvore. Derrubo tudo pelo caminho, agora eu sou pura confusão.
Vocês não entendem o que é sentir e sentir e sentir mais ainda sem poder falar nada. Calada. Morte lenta, riso do diabo. Emano ondas de calor que ninguém sente. Fico na minha, quietinha, ali no canto, sem incomodar ninguém. Nunca quis passar em branco, mas passei. E guardei, guardo, vou acumulando certezas e agonias, e uma hora a fera quebra as grades da jaula, e uma hora eu decreto alforria e vou-me embora. Fui.
Agora sou toda minha, numa nudez nunca antes vista, numa coisa que eu não sei explicar na velocidade em que meu carro vai. Viro as noites dirigindo, sinto essa liberdade bonita, deixo o celular descarregar. Liberto-me com as unhas cravadas nas costas de quem amo. Declaro-me de primeira. Não tenho mais código amoroso. Sou um lobo na pele de lobo, cordeiro quando quero. Não tenho papas na língua, não tenho falas no bolso. Tudo meu é improviso.
Solto o volante, avanço em você. Demorei tempo demais pra dizer as coisas todas, demorei tempo demais pra sentir as coisas toda, agora eu sou redemoinho. Melhor te segurar no corrimão se não quiser voar comigo. Vou ser baque forte, colisão de frente, talvez doa, mas quem liga? Você liga, meu bem? Agora eu amo assim, eu boto pra fuder, eu boto pra fuder.
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