[Você pode ler este texto ao som de Vienna]
Sempre odiei aquele discurso de que a gente deveria seguir nosso coração no matter what. Parecia papo de quem já tinha a vida ganha e não precisava pensar em um monte de coisa, principalmente se você tem obrigações pessoais, financeiras e afetivas com o mundo. Odiei esse papo por tanto tempo que assinei embaixo do que disse Billy Joel em Vienna. Slow down you crazy child, somos muito ambiciosos para quem tem tão pouca idade.
Hoje em dia eu discordo.
Com o tempo, fui percebendo que esses discursos são perigosos pra quem não reflete sobre eles. Gostava muito de ter um porto seguro, chegar em casa e ver a minha vida organizada num quarto cinco por cinco, com todas as coisas ali. Era tudo meu, nada era meu. Meus pais, com muito trabalho e dedicação, sempre me deram todo o possível. Por conta disso, de todo esforço deles e dos gastos, das amarras e tudo mais, concordava que a gente é obrigado a seguir uma linha, mesmo que não seja a do nosso coração. Só depois da minha decisão de voar um pouco com as minhas asas é que percebi como é importante repensar isso.
“Vá com calma” é algo constantemente dito a pessoas como eu, que adoram abraçar o mundo com as pernas. Temos milhares de ideias, de sonhos, de projetos e nos falta foco. Temos iniciativa pra caramba, nos falta acabativa. Os mais velhos dizem que a gente precisa ir com calma, que somos muito novos pra conseguir o que queremos. Já eu me acho velho demais pra conquistar coisas que deixei escapar. Me chamariam de afobado, mas eu discordo. Depois que aprendi a voar com as minhas próprias asas, percebi que seguir seu coração significa botar toda a sua força no presente para fazer um futuro mais próximo daquilo que você sente que deve seguir. Seguir seu coração não significa largar tudo sem ter um plano, muito menos achar que as coisas vão acontecer do nada. Significa preparar o terreno e ter a coragem de se jogar nele quando você sentir que deve, sem demorar demais, sem dar desculpas de que uma hora melhor vai chegar. Porque é justamente o que fazemos: esperamos a hora certa, a hora perfeita, a hora em que sabemos que devemos… mas essa hora não vem com a sorte, é a gente quem decide qual é.
Já fazemos isso pra caramba nos relacionamentos: vamos com calma o tempo todo pra não assustar o outro. Vamos com calma pra não demonstrar sentimentos, vamos com calma pra não dizer o que queremos, vamos com calma pra não fazer com que o outro se sinta especial demais. Vamos com tanta calma que perdemos o prazo, perdemos a hora, perdemos a sensação de dever cumprido mesmo que não dê certo. Vamos com calma e nunca vamos de verdade, gente que aprende a andar e nunca correr, gente que tem medo de ser demais quem é. Imagina perder o amor da nossa vida só porque fomos calmos demais? Viver é animalesco, meu povo. E quem me pede calma demais já diz claramente que não serve pra mim. Eu até entendo a calma de rever a vida, de se reorganizar, de seguir em direção a alguma coisa. Mas calma pra ficar parado? Nah, não serve. Meu peito pede movimento, pede agitação, pede batimento bruto pra sentir que eu vivo. Se isso vale pro amor, o mesmo vale pra vida.
Sempre fui a favor da calma quando não era eu quem controlava as rédeas da coisa toda. Depois que você se pega nas mãos e percebe que o seu destino só depende de você, algumas coisas começam a ser questionadas. Por que você vai se matar de trabalhar pra tirar férias apenas uma vez por ano e não poder ver os seus amigos no final de semana? Por que não planejar uma vida em torno da construção de algo que não te faça perder a vida? As perguntas e as motivações que nos empurram deveriam ser diferentes. Não deveriam ser ideologias extremas que não se aplicam à prática, muito menos ceticismos vulgares que nos pedem pra fechar os olhos. Se você pode, se você enxerga no que você ama uma chance de mudar o seu futuro, não vá com calma, nunca vá com calma. Vá correndo atrás disso, vá correndo atrás de ser feliz, vá correndo atrás de quem ama e de tudo o que te faz bem. Se a sua rotina já permite isso, independente de ser como você quer ou não, ótimo também. Ela te faz feliz, te faz bem, te faz correr na vida em vez de ficar parado. Isso faz sentido. O que não faz sentido é ficar pra sempre numa vida infeliz que te leva a lugar algum.
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