Eu não presto

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Pedi essa música pra você.

Qual?

Essa que o OneRepublic tá cantando.

Não é deles, é do Sam Smith. Se chama Stay With Me.

Isso mesmo, fica.

Não fico. Não com você.

Por quê?

A gente só se dá bem por conta disso: nós dois sabemos que não vai dar em nada. A partir do momento em que você só assiste ao Titanic, você tá seguro, em terra firme. Pode até gostar do filme, achar o romance do Jack com a Rose bacana, mas é tudo fantasia. Quando você embarca é como se você assinasse um atestado de naufrágio. Você sabe o que vai acontecer. Por que entraria?

Pela aventura. Ainda que não fosse, não entendo tanta descrença. Pareço mesmo um navio fadado ao fracasso?

Não parece. Esse é o problema. Você não parece nada disso, mas eu sei que é.

Você tem certeza sobre tudo, já percebeu? Te perguntam sobre uma coisa, você tem certeza. Te perguntam sobre o tempo, você tem certeza. Uma hora as tuas convicções vão te enforcar.

Já enforcam, você que nunca reparou nas marcas.

Então por que você não desata os nós? Maldita mania de amarrar a corda no pescoço e empurrar a cadeira. Você acha que se protege, mas tá aí, matando um monte de coisa só pra se manter razoavelmente seguro.

Assim não dói.

Mentira. Deve doer pra caralho. Deve doer tanto se proteger o tempo todo que você nem percebe como o teu pescoço tá vermelho. Você se enforca e se enforca e se enforca e finge pra todo mundo que é um poço de serenidade e sabedoria. Finge pra qualquer um, menos pra mim.

Tua lua é em quê?

Sagitário. E a tua?

Em leão.

Isso explica os suicídios. Você prefere ter certeza a ser feliz. Você prefere sufocar de orgulho a admitir que não deu certo. Você prefere morrer por dentro do que botar pra fora a dor. Já te contaram que uma hora você me perde de vez?

Não dá pra perder o que a gente nunca teve. Lembra que eu já me apaixonei por você? Naquele dia, no tal filme argentino, primeira vez que não era só sexo. Fui achando que teria vinho e teve pipoca. Nem acreditei. Pouco tempo depois, você me disse que tava namorando. Me enforquei de novo.

Desculpa.

Tudo bem, me senti vingado quando você tomou um pé na bunda. Ri internamente quando você voltou buscando abrigo. Ofereci a varanda, porque aqui dentro de casa você não entra mais.

Isso tudo é medo?

Não, é cuidado.

Comigo?

Comigo. Com você eu não tenho cuidado nenhum. Te deixo na chuva e não sinto pena, te vejo acompanhado e não quebro por dentro. Já morri por você antes, não morro mais.

Tem certeza? Não pareceu isso quando te abracei no show, não pareceu isso quando te pedi pra dormir comigo. Não parece quando você tá comigo sem pensar demais. Você pensa demais.

Penso. Se não pensasse, já teria morrido mais uma vez. Você não entende que teve o teu tempo, mas passou? Que você podia ter dado certo, mas preferiu não dar. Não consigo mais te querer como eu queria antes. Não do jeito que você quer, só se for assim, com tudo bem claro, sabendo que a gente vai dar em nada.

Então você não fica? Nunca mais?

Fico. Eu até fico. Pensando bem, não tem problema em ficar. Eu sei lidar com você.

Fica comigo?

Não, eu só fico. Sem você.

E o que te garante que só ficar vai dar jeito nessa coisa toda que você sente aí dentro, nessa coisa toda que eu sinto aqui dentro?

Eu sei que vai.

Por quê? Como você sabe que vai se manter a salvo de mim se eu quiser realmente que você fique?

Porque eu te conheço bem. Te conheço feito a palma da minha mão. Sei quando você fala a verdade e quando blefa. Sei quando é charme e desafio, sei quando devo me afastar. A gente funciona assim e assim será. Porque igualzinho a você, meu bem, eu não presto. 

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