[Você pode ler este texto ao som de Paint The Silence]
Esquerda, esquerda, esquerda, esquerda, direita, it’s a match. Se você é conectado nas últimas novidades sobre tecnologia e é um dos muitos solteiros espalhados por aí, você com certeza sabe do que eu tô falando. O match – que significa combinação – sugere que você e uma outra pessoa gostaram uma da outra. Simples, fácil, baseado nas fotos, nos amigos em comum, nos gostos do Facebook… mas será que é tão simples assim a equação que diz se a gente combina mesmo com alguém?
Caetano Veloso tem uma frase que eu adoro, vez ou outra cito, que me faz pensar um pouco mais sobre isso. “O teu corpo combina com meu jeito”, diz ele, e como é que a gente pode ter certeza disso se as nossas mãos nunca se tocaram, se o máximo que aconteceu foi um rápido encontro cibernético isolado igual aos outros 100 e tantos que eu e você colecionamos? Tem até tutotial na internet ensinando a como conseguir mais matches. É complicado. E isso me leva a pensar em quão difícil tem sido criar empatia e realmente combinar com alguém.
É tudo uma questão de gosto particular e do maldito timing. Um belo dia você pode sair na chuva com o seu guarda-chuva amarelo e esbarrar numa baixinha dentuça, de cabelos encaracolados que tava lendo O Diabo Veste Prada no Kindle. Ela pode parecer estranha e ela vai te achar estranho, mas é isso que causa o frenesi, a estranheza. A gente precisa se estranhar pra se perceber. Raramente fui atraído ou notei alguém que não me causasse alguma estranheza, que não me tirasse da bolha que eu andava vivendo.
Junte o seu gosto particular e as suas expectativas e eleve isso ao quadrado. Se você já achava difícil suprir as suas necessidades, agora imagine suprir as necessidades de duas pessoas juntas, quando ambas estão tentando se ajustar, tentando regular os altos e baixos pra poderem se encaixar. Vai mão aqui, pé ali, passo à frente, recuo, será que, não sei mais o quê, mas parece uma dança. E haja conversa no café ou um chopp depois do trabalho, haja sexo em algum motel até subir lá pra sua casa, haja períodos de silêncio e encantamento sucedidos por frustrações e surpresas bonitas. E haja vontade de continuar levando isso adiante quando tudo se compara ao trabalho de reger uma orquestra porque, bem, é isso mesmo. O tal match surge assim.
O match da vida real não é medido pela aparência ou pelas bandas ou posição política ou filme preferido ou tatuagens que o outro tem. Não, isso só alimenta um gosto pessoal e a sua expectativa de encontrar um tipo imaginário que vai te satisfazer no mundo das ideias. O tal match dá um trabalho da porra, leva tempo, ultrapassa a barreira do contato tecnológico e tem muito olho no olho e silêncio pra aparecer e dizer que vai ficar. Enquanto isso, a gente se acostuma com os alarmes falsos e brinca de apertar o botão pra encontrar o amor da nossa vida, quase um The Voice dos relacionamentos.
Não, gente, o match da vida real é muito mais difícil. Quem me dera se aquela combinação bonitinha fosse decisória, mas ela é só um embrião. E a gente tem que começar a enxergar as coisas assim, do modo embrionário, pra cair a ficha de que é preciso vontade, disponibilidade e um pouco de esforço pra que a carroça pegue no tranco. O resto a vida vai dando um jeito de ajudar depois que engrena. A gente tem que começar a perceber que passar alguém pro lado direito não significa que a pessoa vai ficar, até porque, cá entre nós, o lado do peito que importa mesmo nessa história toda é o esquerdo. E só ele.