Se eu fugi


[Você pode ler este texto ao som de All Of Me]

A sua respiração na minha nuca no meio da nossa primeira noite juntos me deu um arrepio na espinha que só dá quando algo muito grande vai acontecer. Eu fingia que dormia, mas, na verdade, sentia um medo desesperador. E se você fosse, e se não voltasse, e se provasse ser tudo o que eu não aprovo em um homem, e se fosse dessas pessoas que até tenta amar, mas não consegue? Pior: e se eu te amasse mais do que todas as vezes que já amei?

Então eu levantei da cama em silêncio e peguei minha calcinha jogada pelo quarto. Cacei o vestido amassado que você arrancou ainda na sala, quando a gente já não sabia ao certo que raios estava fazendo. E corri. Morrendo de medo de me desacostumar com o fato de ser melhor sozinha do que a dois.  Apavorada com a ideia de sentir vontade de você no meio do filme romântico da sessão da tarde. Sem saber ao certo como agir com a possibilidade de ter que me desfazer da solidão.

Eu fugi quando você tentou me puxar no meio da balada, com os dedos na minha cintura, me fazendo sentir uma sensação que há tempos não sentia: a de pertencer a alguém. Porque eu, cazzo, eu não preciso de ninguém, ouviu bem, de ninguém, pra ser feliz. E não precisava mesmo, até você aparecer. (Me diz, você também não fugiria?).

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Eu fugi porque você me levaria a lugares incríveis, me faria escutar bandas sensacionais, me apresentaria aos seus amigos e me faria sentir como se eu pertencesse ao seu mundo. E depois, como todos os outros, arrancaria tudo de mim e continuaria me assombrando como fantasma em esquinas, paredes, quadros, músicas, estampas e cheiros. Você iria e eu ficaria aqui tentando reconstruir os pedaços de nós dois que a gente achava que bastava.

Eu fugi porque o amor assusta.

Eu só não sabia que, quanto mais a gente foge, mais perto fica do nosso próprio precipício particular. Que o cérebro perde a força, a razão deixa de existir e, ao invés de dar meia volta, a gente vai. Se joga, se rende e reza pra não se perder. Ou se perde – como eu me perdi inteirinha por você.

Porque, enquanto eu fingia que dormia, enquanto me enganava que fugia, no fundo, no fundo eu já sabia. Fui acabar amando você.

Karine

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