Carta pra você (que ainda não chegou)


[Você pode ler este texto ao som de City & Colour – Grand Optmist]

Olha pra mim e diz que chegou. Eu já ando cansado de bater de porta em porta, sempre tentando, sempre com um sorrisão na cara e um buquê de flores ou um vinho desconhecido pra brindar por solidões individuais que ainda não se destacaram na multidão. Percebe em mim alguma coisa mágica, um olhar no metrô, a forma como eu viro uma página de livro, os sapatos engraxados com afinco doentio e todos esses pequenos detalhes-ganchos que eu espero que você pesque.

Cuida de mim e diz que eu posso descansar a cabeça no seu colo durante a viagem de ônibus, ou conta comigo pra pousar a mão na sua coxa e assobiar feito passarinho a música do rádio num carro. Cuida e me olha de novo pra me enxergar. Já passou tanta gente que me olhou uma, duas, muitas vezes que eu já nem conto mais. E toda essa gente me atravessou o peito como se nunca tivesse me enxergado direito, entende? Por isso que eu me sinto feliz ao primeiro sinal de que você vai me enxergar e dizer que reparou numa pinta escondida por trás da barba e por trás da casca pra me chamar de teu.

Repousa em mim e se esboça aos poucos. Escorrega comigo pelos braços, pelos pelos e pelas pernas e vai se desenhando aos poucos, em torno de mim enquanto me rabisca com giz de cera. Dá tempo de apagar alguma listra que a gente não gostar e rabiscar, rabiscando a gente se entende e manifesta aquele desejo infantil de se fazer entender de forma prática. Me desenha um sol e me chama de meu bem? É que ninguém nunca me chamou assim e eu sinto um carinho grande, desses de abraço de urso, quando alguém chama alguém assim – só que nunca fui eu.

Não entenda esses pedidos todos como receita pronta de bolo, por favor. Nem vai achando que eu sou um desses mandões-carentes-abarrotado-de-sonhos porque disso tudo eu só tenho sonho. Tenho sonho-esperançoso, bem bonito mesmo, de poder ser feliz vendo você sorrir. Você que já chegou e nunca olhou pra mim ou você que eu juro, prometo e espero ainda conhecer num ônibus vazio com muitos lugares pra dois – com você sentando do meu lado e me escolhendo pra meu par. Dizendo algo como “toma aqui o meu amor e constrói tuas coisas junto das minhas, e não à volta dele”. Toma aqui o meu e vamo ser feliz (porque eu te juro, é o que eu sempre quis desde que eu era pequeno e queria crescer).

Eu acho que no fundo é o que essa gente toda quer. Aquele amor por acaso, sem grandes firulas ou novelas mexicanas, pra trocar o drama por carinho. Por isso que eu ainda tenho esperança, uma esperança simples de te achar numa dessas vezes em que tocam minhas campainhas.

Vem ser feliz comigo e desembaça esse óculos. Bate na minha porta e enxerga o meu rosto, as minhas rugas (ainda) finas, as entradas sendo cavadas no cabelo e alguns fios brancos aparecendo, bate na porta e não me pede açúcar, me pede pra dividir um sonho bom e uma vida doce contigo. Eu controlo naturalmente pra não deixar a gente com diabetes. E jura, mas só se quiser, se sentir de verdade, que vai me amar até amanhã de manhã quando acordar desse sonho bom. Ri da minha cara de sonho e dessa vez me abraça, me abraça como eu sempre quis abraçar alguém numa tentativa otimista de encontrar você, que eu ainda não encontrei.

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