Comparações.


[audio http://dl.dropbox.com/u/104739227/Mumford%20%26%20Sons%20-%20Little%20Lion%20Man.mp3 |titles=”Little Lion Man – Mumford and Sons”]

O maior pecado que se pode cometer é entregar de bandeja o presente para arrastar as correntes enferrujadas do que já passou de novo.

Mas é inevitável.

Eu me confundo nas mudanças bruscas de um rosto pro outro. Nas linhas tortas que, de repente, se endireitaram. Nas preferências de cores que voaram do azul ao amarelo. Nos carinhos trocados e destrocados e das cores do cabelo. Nas cartas não enviadas que agora se enviam e dos chaveiros que carregam a chave da minha casa. Nas chamadas não atendidas e no conteúdo das mensagens. Mesmo que imaginárias.

Vocês não são iguais, mas se encontram num mesmo ponto de atrito. É que eu não sei escolher entre deixar ir e dar mais aquela olhadela por cima do ombro. Troco os nomes na minha cabeça. E troco os cheiros na cama, na rua, nas mãos suadas que se seguram por aí. Troco as cenas numa espécie de Deja Vú que se expressa no meu rosto.

Troco as contas e erro as datas e ela nem percebe. Ainda bem. Ela odiaria pensar que é trocada por um fantasma que dorme ao nosso lado todos os dias.

Não é por mal. É que a comparação surge intimamente num gesto ou outro que se sucede. Nossos amores têm essa qualidade única: se diferenciam tanto – ou se parecem tanto – que as comparações sofrem alterações radicais de um relacionamento para o outro. Comparações e a sensação de que isso já aconteceu antes com outra. Comparações e a sensação de que se fosse com outra, seria diferente. Comparações e a sensação de que isso nunca aconteceria com aquela tal pessoa.

Mais do que armadilhas, as comparações são o nosso termômetro de satisfação assegurada. São pendências nossas com nós mesmos, mas a gente cisma em projetar o que incomoda no outro. É injusto com quem vive a gente agora. Não dá pra competir com um fantasma que tem as falhas deixadas de lado e só figura nas lembranças boas. Porque a nossa memória afetiva é seletiva e nos faz esquecer temporariamente de que o passado foi complicado quando o presente é tão complicado quanto.

Comparações são doces na mão de uma criança. Têm gosto bom e parecem inofensivas num primeiro olhar. Mas, quando hábito, se tornam vício. Estragam os dentes. Causam vermes que vão corroendo a gente por dentro sem que a gente dê conta. Até que chega num extremo em que a gente percebe tudo. Quando elas começam a alfinetar demais é porque alguma coisa está errada. Ou o passado ou o presente.

Quem mandou a gente sofrer da síndrome de volta para o futuro?

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