Por favor.


Por favor, volta aqui e coloca as coisas no lugar. Você saiu e deixou tudo uma bagunça. Eu não tenho empregada – e nem condições – pra limpar isso sozinho. Por favor, não pendura mais a calcinha no chuveiro. Eu sempre acho que ela vai acompanhar uma toalha molhada e uma bronca por ter deixado a tampa do vaso aberta. Mas não. Eu tenho que ficar vagando por aí procurando por alguns farelos e pedaços de mim pra jogar no lixo. É só sujeira e uma linha fina de poeira e cinzas que me dá alergia.

Por favor, não ignora o bilhete na geladeira. Não sai de casa assim, do nada, batendo a porta e deixando tudo revirado. Você podia ser mais organizada e lavar a louça suja de uma vez. Deixa os sacos pretos lá fora, que é pra desovar a gente de uma vez. Fecha bem a porta do armário e não empilha as coisas – elas sempre caem por cima de mim. Por favor, não se esquece da hora. É que eu tento dormir cedo e só consigo com você em casa. Tenho tido crise de abstinência por causa das tarjas… Se você pudesse trazer umas caixas e deixar aqui, por favor.

Por favor, não fica nisso de só mais cinco minutos. Quanto mais a gente estender, pior. Levanta logo e diz que não vai tomar café da manhã, que é pra eu não fazer à toa. Que é pra eu não me fazer à toa. Não precisa fazer as pazes comigo nem dar bom dia pro porteiro. Só larga mão de me deixar em movimento pendular todos os dias. Por favor, não me trata como criança. Não é que eu dependa de você e que precise de você pra aprovar tudo o que eu faço. Eu ainda sei amarrar o tênis pra não cair nos meus próprios pés. Ah, por favor, joga as camisinhas da gaveta fora. Tão todas vazias e nenhuma delas é sua. Faz mal guardar essas coisas por muito tempo.

Por favor, arruma logo o meu guarda-roupa. Deixa as coisas organizadas por cor e tamanho que é pra eu pegar qualquer coisa quando tiver com pressa. Atrasa o relógio pra eu achar que ainda dá tempo de fazer alguma coisa e te pedir pra ficar mais um pouco. Joga as caixas de pizza fora e vê se tem água na geladeira. Se não tiver, tá tudo bem. É quando a geladeira tá vazia que as coisas vão bem. Quando tem comida é porque você esteve aqui – e eu não dormi de novo. Por favor, vê se vai ou se fica que eu já não consigo mais fingir que as coisas tão bem. Bota os pés no sofá e me espera com uma das minhas camisetas, ou muda o perfume e deixa o meu pescoço sem cheiro nenhum. Deixa essa mania de usar porta-copos e deixa logo uma marca na escrivaninha, ou então nem abre a cerveja que é pra não aguçar o paladar à toa. Por favor, vai embora da minha vida, ou tranca a gente num quarto que é pra esgotar tudo isso logo de uma vez.

Comentários