se um poema ainda não nasceu é porque está indiferente. e jura: não achou que fosse possível. justo ela que aproveita-se do choro atrevido, que explode em uma calçada no caminho de volta para casa, para desabafar a pedaços de papel. ela que gosta da condição de não pertencer a nada e nada ter que a pertença. que anseia justamente pelo que nunca será seu, apenas para continuar tomando vento pelas madrugadas sem avisos, relatórios e manifestos conjugais. ela vai dormir esta noite ironizando o fato de que acordar ao lado de um estranho é menos estranho que acordar ao lado dele.
e pensará se ele já desejou presenciar os olhos dela revelando o tom verde em uma dessas manhãs cheirando a álcool, cigarro e ego. não vai dormir. mais uma vez. como tem acontecido sempre que se compara a outros objetos tão parcialmente disponíveis quanto ela mesma. vai se emocionar diante de qualquer jorro de ignorância estampada em uma TV de tardinha. um grito de socorro de seu próprio corpo, que ela vai ignorar. talvez questione o porquê disso tudo para as paredes de um quarto silencioso e seu. mas escrever não vai. escolherá fechar os olhos e cantar uma música alegre para mascarar a decepção que não a surpreendeu tanto quanto não amá-lo mais. e jura novamente: não achei que fosse possível.
Priscila Nicolielo escreve até correio elegante. Roteirista do programa Esquadrão da Moda (SBT) por amor e dinheiro. Dramaturga em coma. Publica seus impulsos aqui e ali; sendo aqui, seu blog; e ali, seu tuíter.
Ela é a autora desse texto e, se eu fosse você, correria agora no blog dela para ler mais. É só clicar aqui.