Não é nada.


– Posso fechar a janela?

– Que foi?

– O vento. Tá bagunçando meu cabelo…

– Ahh…claro. Vou mudar a estação de rádio, ok?

– Uhum.

(…)

– Você tá tão calada. O que foi?

– Nada.

– Então que cara é essa?

– Nada.

– Odeio quando você faz isso. Tem alguma coisa acontecendo e você não quer me dizer. O que eu fiz dessa vez?

– Nada.

(Sabe essa música que tá tocando? Foi a primeira vez que a gente se encontrou. Eu já te conhecia há algum tempo e você já dizia que gostava do meu cabelo solto. Mentiroso, é claro. Ou pelo menos nunca reparou na juba que se forma quando bate um vento forte. Na verdade, você odeia quando eu não me deixo acontecer. É, essa sua coisa de querer que eu seja espontânea o tempo todo. Você gosta desse frescor da naturalidade. Quando me pega distraída olhando alguma criança brincar. Você gosta de crianças, meu bem. Acho que você vai ser um ótimo pai. Um pouco distraído, mas ainda assim ótimo. Ah, foi bem nessa parte da música que você me deu a mão. Eu não entendi direito. Não é a sua cara fazer isso. E, de repente, você me beijou. Achei bem fraco, por sinal. Você só encostou os lábios nos meus no exato momento da pausa. Dava para ouvir o seu coração palpitando e o seu nervosismo fazia o seu lábio tremer. Eu achei isso lindo. Você não queria me dar um beijo daqueles. Você só queria me beijar. E daí para que você se transformasse num dos amores mais bonitos que eu já tive foi um pulo.

A minha mãe te odeia até hoje por você conseguir me tirar da cama às 5h da manhã com a única promessa de que vai me fazer feliz. Você nunca prometeu nada. Quer dizer…prometeu que sempre se lembraria da nossa música. É, essa daí que tá tocando há alguns segundos. E você nem pra tirar a mão do volante e passar na minha perna pra dizer “lembra?”. Acho que você não me ama mais. Você esqueceu a história mais marcante de nós dois. Ou eu estou um pouco neurótica. Pode ser a TPM. Mas a verdade é que eu queria mesmo que você virasse o rosto, me desse um sorrisão daqueles de moleque e me lembrasse do momento mais gostoso que a gente já teve. Queria que você lembrasse de como foi apostar comigo que eu não conseguia ficar dois minutos de boca calada e olhos fechados e aproveitar o meu fraco por apostas pra me roubar um beijo. Você se arriscou, hein. Eu podia ter te dado um tapa sonoro e ter ido embora. Mas, de alguma forma, você já sabia que eu ia ficar aqui.

Você me irrita. A música já passou da metade e nada. Estou decepcionada com esse nosso amor. Será que ele enfraqueceu tanto a ponto de você esquecer a nossa música? Ou será que ela ficou velha demais para que você se lembrasse? Acho que a gente precisa de outra música. Acho que eu vou soltar o cabelo pra chamar a sua atenção. Vai que funciona e você pelo menos se lembra do que gostava mais em mim. Acho que eu enrolei todos os meus pensamentos e já nem me lembro direito porque eu tinha ficado irritada com você. Você é o meu amor e todo o resto não tem rima. Independente da canção que toque, ela sempre vai falar sobre nós dois…)

– O que foi? Que sorriso na cara é esse?

– Nada. Eu já disse que não é nada.

– Mulheres…

– Eu te amo, sabia? Agora troca essa merda de estação de rádio porque eu não gosto dessa música.

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