[Você pode ler este texto ao som de Hurts Like Hell]
Quando estivemos juntos lá longe, tão longe de casa, nós saímos para comprar coisas baratas. Nós conversamos pela primeira vez e você me fez um convite meio atravessado para sairmos juntos. Não deu certo, mas ainda assim nós nos beijamos naquela noite e todas as noites que seguiram não foram o bastante para me fazer esquecer.
Um dia eu senti falta, tanta falta daquele beijo que eu parei tudo para pedir mais um. E você deu. Você me deu um beijo naquela manhã, bem depois do café. E um na noite seguinte.
Então você passou a sair do trabalho e ir dormir comigo, não importando que eu já estivesse no décimo sono quando você chegasse: eu estava sonhando com você, segundos antes de você se materializar em carne e ossos e charme me dando um beijo de boa noite.
Você me deixava adormecer sem se importar. Você se aninhava em compreensão e dormia comigo. Pouco interessava se você queria contar do seu dia ou queria um pouco de atenção: dormir ao meu lado para você bastava, assim como bastava para mim acordar e ver seu rosto tão sereno e tão perto segundos antes de eu te deixar para o trabalho.
Noutra noite, você acabou se abrindo. Fomos comer pizza e, mais que fatias, nós dividimos histórias. Talvez você imaginasse o quanto eu amo histórias, mas naquela noite, eu amei o fato de você ter aberto o seu próprio livro pra mim. E eu olhei nos seus olhos enquanto você falava das suas mágoas. Eu senti o pesar quando você me mostrou a sua dor. E eu te abraçei quando você se mostrou vulnerável, me dizendo que precisava ser forte.
E você é forte. E eu nunca duvidei.
Em algum momento você começou a ficar com todos, eu comecei a ficar com o restante e quando dei por mim, estávamos afastados de perto. Acho que beijamos algumas das mesmas bocas – que não as nossas -, e até isso de uma forma bizarra aproximava a gente.
Nós entendemos a necessidade de estar com mais alguém, e embora eu nunca tivesse acreditado nisso, eu sempre soube que você iria mas voltaria para mim. Eu também ia e voltava e lá estava você, e talvez isso seja amor. Talvez fosse compreensão. Mas você sabia ser lar, mesmo quando eu visitava tantas salas vazias.
De qualquer forma, é claro que um dia o nosso fim acabou, se nem os dinossauros viveram para sempre, quiçá o universo viverá, como esperar isso de nós dois?
Você acabou sendo o responsável por me provar errado em várias coisas: o tanto que eu não acreditava e você, dia após dia, me mandou olhar melhor para tudo ao meu redor e compreender que as coisas não são como ensinam na escola. Ou nos filmes. Ou nas séries.
Ou seja lá no que se aprende hoje.
Você me mostrou que as pessoas, os relacionamentos, os cafés da manhã e o verbo “estar” são muito mais do que se vê por aí. Nenhuma lagoa é só superfície e nenhum mar só onda. Se boiamos ou afundamos, depende de como enfrentamos o que vem.
Você disse que me ama e eu te pergunto o que é amor para você, porque nós estivemos juntos depois de tanto tempo e eu não soube o que pensar. O cenário não era o mesmo mas você era. Eu era. Nós éramos reais e eu esperava mais, sem querer. Eu deveria saber que você voltaria para me mostrar que as coisas não são como eu acredito, e você fez isso.
Seria injusto dizer que eu não fiquei decepcionado ao ver você ir embora sem que trocássemos sequer um beijo, mas eu também preciso ser sincero e dizer que doeu muito te deixar ir, mesmo que eu tenha segurado as lágrimas até você sumir de vista.
Uma vez você me falou sobre ser forte, e acho que eu aprendi algumas coisas.
Eu não consegui ser tão forte a ponto de te deixar ir e impedir que as lágrimas lavassem o meu rosto quando você não estaria mais vendo, mas eu preciso te dizer uma coisa que você também não vai saber.
Eu te deixei ir. De mim, eu deixei. Eu destranquei a porta que guardava um milhão de sentimentos aprisionados, e eu posso ser lar mas não posso ser esse cofre de infinitos que não são só meus.
O nosso infinito também é seu. E se nossos planetas estiverem destinados a coexistirem sem nunca mais se tocarem, tudo bem.
Eu entendo que muito da beleza em mim foi cultivada por você, e sei que tem pedaços de você que eu fui capaz de atingir. Cada parte que você tocou eu não vou esquecer, nada que diz respeito a nós dois vai sair da minha cabeça e muito menos a vontade de um último beijo que dissesse tchau. Você foi embora sem que tivéssemos isso.
Mas isso não era tudo o que tínhamos e não era tudo que eu queria.
E das marcas e lembranças, eu estou cheio.
De carinho, também.
Você foi, eu sei.
Mas você sempre estará aqui.