Ouvi você me chamar e quase não acreditei que era a sua voz que lambia meu nome. Um frio gostoso percorreu minha espinha e me virei apenas para confirmar o que as minhas entranhas já sabiam: era mesmo, mesminho, você. Vestido de tara, tesão e luxúria dentro de um blazer risca de giz, calças jeans levemente surradas e o velho All Star preto. Você tinha fogo nos teus olhos de piscina e teu sorriso escondia tua idade. Você estava menino demais.
Fui tomada por uma ira que não me pertencia, porque a vida passava muito bem, obrigada, sem a tua presença caótica e conturbada desestruturando minha rotina. Eu havia me reerguido, me retomado, me reinventado. Dei de dedo na sua cara, cuspi todo rancor que tinha escondido na memória e quis esbofetear você, só pela petulância te ter roubado o meu amor para logo depois ir embora, levando toda minha decência, inocência e paixão dentro da sua mala antiga.
Você me puxou, prendendo minhas mãos como se esperasse pelo tapa que nem ameacei dar. Enlaçou-me firme pela cintura e puxou gostosamente meu cabelo, tumultuando meu autocontrole e assoprando longe a índole que costurei, pedaço por pedaço, desde que saístes porta a fora. Um beijo e me amoleci inteira…
(…)
Você dorme. Costas deliciosamente nuas, rosto de menino e cabelo bagunçado. Eu te acarinho as omoplatas, enquanto queimo um cigarro sem tragar. Ainda sinto você escorrendo no meio de minhas pernas e a dor do prazer queimando minhas entranhas. A raiva entra debaixo dos lençóis, tímida e silenciosa. O cigarro se apaga. O desejo se dissipa. Explodo. Visto-me atrapalhada.
Sinto muito, eterno amor, mas agora é a minha vez de ir embora.