[Você pode ler este texto ao som de Don’t Want Your Love]
Uma das maneiras mais difíceis de lidar com o passado é quando ele resolve voltar pra vida da gente de tempos em tempos, sem aviso prévio e sem que a gente tenha escolha. A gente superou a tal pessoa, tá lá, super bem, vivendo cada dia com uma tranquilidade denunciada pelo sono fácil na hora de dormir e a ausência da falta. A pessoa tatuou a gente, mas as marcas na pele não ardem tanto assim se a gente não fica refazendo os passos dentro da mente. Tô indo bem, até tenho aprendido a ser feliz sem comparar cada pessoa com cada uma das coisas que você fazia, até descobri que o luto é um processo que depende muito mais da gente do que do outro depois do fim. Até que você volta.
Existe um karma inevitável em todo relacionamento: ninguém ama o outro com a mesma intensidade. Com você, eu amei mais. Com ela, o peito que pulsou descompassado não foi o meu, apesar do conforto e da maneira com que eu me entreguei – ou tentei. Não existe problema nenhum nisso tudo, é normal pra caramba. O problema é quando a pessoa acha que a gente ta supervulnerável por sentir demais e faz disso uma desculpa esfarrapada pra pousar na nossa mão de tempos em tempos, numa tentativa desesperada de fazer a gente acreditar que dessa vez é pra valer e ela não vai se dissipar feito fumaça depois do terceiro encontro. Essa é uma das formas de ser mais filho da puta com o outro: revirar o passado de um jeito doentio que vai fazer o outro revisitar a lembrança antes de você ir embora cinco dias depois, por mais que as suas intenções sejam as melhores. Não adianta lidar como se não soubesse, como se ignorasse as mãos dadas e o quanto você foi importante pro outro no passado. Nada disso importa. Importa a atitude e o estrago momentâneo que isso pode causar na vida do outro.
Pra você pode ser nada, pra mim pode ser o combústivel definitivo de alguma coisa que eu queria deixar quieta aqui dentro.
Essa é uma das coisas mais dolorosas que a gente aprende na vida e geralmente só aprende quando está do outro lado da moeda: não se põe na estante o coração e a vida de alguém. Primeiro, porque é ser cruel com o outro. Segundo, porque é uma pedra que a gente não precisa colocar no sapato alheio. Eu não quis antes, não quero agora, então por que alimentar o ego e as esperanças alheias com um retorno momentâneo que não vai durar até o pôr-do-sol no fim de semana?
Às vezes a gente precisa entender que as pessoas precisam muito mais de nós atados do que pontas soltas. Decretar o fim definitivo de um relacionamento pode parecer insensível demais, mas talvez seja a alforria sentimental que o outro precisa pra seguir em frente sem se preocupar em revisitar o passado todas as noites antes de dormir. É menos romântico, é menos poético, mas é mais honesto.
Eu te amei pra caramba, mais do que deveria – eu sei -, mas isso não precisa ser motivo nenhum pra você voltar. Você não me quis antes, não quer agora e não existe problema nenhum nisso. O problema é você voltar bradando estadia quando eu sei que a diária termina ao meio dia do dia seguinte. Não adianta usar o jeito com que o teu peito descompassa milimétricamente quando você ouve o meu nome ou cada uma das coisas que você sente por mim como motivo pra voltar. Não adianta usar a falta que você sente de mim – ou que seu ego sente de mim – quando você não pretende de verdade colocar um ponto final – mesmo que infeliz – nisso aqui. Você não precisa ser o algoz de ninguém, e ninguém merece ter que conviver com um fantasma do passado de tempos em tempos. Nem mesmo eu.