O tempo só passou pra você


Peguei o jornal e fiquei assustada. Como assim já é 2016? Ontem mesmo passeávamos de mãos dadas! Como assim?

Parece que o tempo voou pra você enquanto caminhou feito tartaruga por aqui. Uma velha tartaruga com o casco quebrado, lenta e sôfrega, sentindo pena de si mesma.

Discutem a Inglaterra e a União Européia e só penso nos nossos planos de viajar o mundo. Éramos jovens, tolos e simplistas, mas como éramos felizes!

Debatem o impeachment e fico tentando imaginar de que lado você está. E ao seu lado, quem estará?

Eu nunca cursei aquela pós que jurei que faria. Não fui para a Irlanda, não pintei o cabelo de roxo e nunca mais chamei alguém de meu amor enquanto mordia aquela parte entre o pescoço e o ombro.

E você, terá desistido do curso que odiava? Será que um dia entrarei em um ônibus e darei de cara com a sua cara redonda e sorridente? E se acontecer, sentaremos lado a lado mostrando fotos no celular e encerrando o percurso com um encabulado “a gente se vê”?

Tá certo que fiz muita coisa, mas ainda me assusta que tenha passado tanto tempo. Assusta que tenha passado tanto tempo sem que a saudade passasse.

Ela dá tréguas cada vez mais espaçadas, é verdade. Mas ir embora, hmmm… Não!

Você faz ideia de quantas páginas rabisquei na tentativa de riscar sua lembrança da minha memória? Faz ideia de quantos posts naquele blog idiota que só você lia?

Em algumas noites eu saía e o álcool era um bom amigo. Brincava de faz conta e fingia que aquelas bocas, todas as bocas, eram suas.

Macias e frias, quentes e lambuzadas, doces e estranhas. Eram a sua boca engolindo a minha, perguntando meu nome, dizendo para irmos para um lugar mais calmo.

Um lugar mais calmo. Aquelas bocas que eram a sua e não eram de ninguém certamente não imaginavam que meu único lugar calmo seria ao seu lado.

Como é que eu posso seguir adiante com a porra da minha vida se até o jornal me assusta?

Estagnei naquele dia, naquela época, na história que há tempos ninguém conta mais.

Onde quer que você esteja, aqui ou na Irlanda, num pub inglês ou em uma manifestação na Avenida Paulista, só queria que soubesse… Só quero que saiba… O tempo voou e eu continuo caindo. Acho que nunca mais terei os pés no chão.

 

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