[Você pode ler este texto ao som de The One]
Quando seu olhar atravessou o meu no meio daquela multidão movimentada foi que eu senti uma coisa estranha palpitar aqui dentro implorando pra que eu corresse até você e me apresentasse antes que a multidão fizesse a gente se perder antes mesmo de ter se encontrado. Seu olhar me atravessava porque não era por mim que você estava esperando, não era por mim que você implorava, nem era por um amor repentino desses que pega a gente de surpresa que você suplicava. A gente nunca espera por uma coisa dessas, meu bem. Não é uma daquelas coisas que a gente circula no calendário e conta os dias pra encontrar. É um precipício ao qual estamos sujeitos a dar de cara a qualquer momento. É o parapeito sem grade e sem placa de aviso ao qual estamos fadados a esbarrar hora ou outra quando caminhamos sozinhos. E você, meu bem, você me apareceu como penhasco, e eu não fui andando, não brequei pra evitar a queda. Me joguei.
Você não sabia, não tem como saber. A gente nunca imagina quando alguém completamente desconhecido esbarra com o nosso mundo com vontade de ficar. É que a gente atravessa as pessoas, a gente esbarra no mundo e nos outros e não enxerga, a gente leva a vida sem se dar conta dos mundos com os quais a gente pode colidir o tempo todo. Mas eu te conhecia, meu bem. Alguma coisa aqui dentro dizia que eu te conhecia. De umas fotos no Instagram ou de um sonho bom. De um futuro ideal que eu rabisquei nas paredes do quarto ou da lembrança dos dias em que eu ainda ia ser feliz. De uma prece que eu fiz no altar ou da nirvana perfeita de quando eu me libertei das amarras.
Você não acreditou quando eu te disse. Não acreditou quando eu te contei sobre o futuro que eu havia traçado pelas linhas do teu rosto. Não acreditou quando eu escrevi sobre você no meu diário e num blog pra contar pro mundo sobre as coisas que você me causava, sobre os risos involuntários que você me arrancava sem saber que eu sou meio louco, mas que o amor deixa a gente assim mesmo. Não acreditou porque era bom demais pra ser verdade, e talvez por isso nem chegou a ser.
No início frustra um pouco, mas ta tudo bem, sabe? Às vezes a gente precisa aceitar que a gente esbarrou outro e imaginou um futuro e o outro não. Às vezes a gente precisa entender que não existe nada de errado em rabiscar histórias em rostos desconhecidos, imaginar um afeto bonito que exista somente dentro da nossa cabeça. Todo mundo está sujeito a isso. É bonito pra caramba. Torna a gente mais humano. Nos mostra que nossos vazios podem ser preenchidos por um pingo de esperança, por mais raso que ele seja. Porque uma hora a gente não atravessa alguém, uma hora a gente percebe o esbarrão, decide ficar de novo e tentar. Uma hora o olhar do outro estagna no nosso também e a gente se dá conta de que amores por acaso podem até fugir do nosso plano racional ideal, mas viram nosso mundo do avesso. E, na maioria das vezes, é se virando do avesso que a gente verdadeiramente se descobre.