O que eu estou fazendo da minha vida?


Você acorda, levanta, se arruma, vai para o trabalho. Senta na frente de um computador, levanta, come, senta de novo na frente de um computador, levanta mais uma vez, volta para casa. Toma um banho, assiste um episódio de alguma série, confere suas redes sociais e dorme. No outro dia, a mesma coisa. Uma escala fordista de atividades sem ânimo, sem perspectivas de grandes mudanças, sem graça. Se você nunca contou a quantidade de vezes que se pergunta, todos os dias, o que anda fazendo com a sua própria vida, aviso que o número pode ser assustador.

A maioria dos jovens adultos que orbitam um pouco mais para baixo ou mais para o alto da classe média brasileira sofre do mesmo mal: a incerteza sobre a própria vida. Uma geração inteira que foi criada para acreditar que existia uma fórmula que deveria ser cumprida e que agora patina em cima de um lago congelado de insegurança. Fulano nasce, Fulano estuda, Fulano se forma, Fulano trabalha, Fulano se aposenta, Fulano morre. Muita gente trata isso como um resumo básico da vida, mas isso não é vida. É só existir, e há um abismo profundo que separa viver de existir.

Os mais velhos nos dizem para que sigamos nossos sonhos, mas até nossos sonhos, no geral, são condicionados. Tente sonhar além de um diploma, de uma casa, de uma família, de uma promoção no trabalho, uma viagem de férias e ver o que a comunidade em volta acha disso. E o lance é que quando alcançamos esses objetivos, continuamos insatisfeitos. A felicidade de ter alcançado alguma coisa até vem, mas a angústia antes de dormir não passa. É difícil se sentir triste sem saber de onde vem a tristeza.

O motivo é que ninguém te explica isso, mas somos condicionados o tempo todos a achar as coisas ao invés de ter certeza, a digerir informação pronta ao invés de praticar o autoconhecimento, a ouvir o que os outros estão dizendo ao invés de escutarmos nós mesmos. É desse encaixotamento que vem a angústia nossa de cada dia. A gente segue o modelo que é dito como o certo – pior ainda, como o único possível – e no final do mês só o que temos são as contas pagas. É pedir demais viver ansiando por algo maior do que ter a conta de luz em dia?

A OMS prevê que até o ano de 2020, daqui a apenas quatro anos, a depressão se torne a segunda maior causa de incapacidade e perda de qualidade de vida na população mundial. Depressão é coisa séria. Uma pesquisa sobre o assunto divulgada há uns anos pela Unifesp apontou que, dentre adolescentes e jovens adultos, quase um em cada dez já pensou alguma vez em tirar a própria vida. Além disso, mais de 21% dos brasileiros na faixa dos 14 a 25 anos têm sintomas indicativos de depressão – e vale lembrar que especialistas acreditam que o número seja maior graças à dificuldade que homens têm em relatar problemas emocionais e psicológicos.

Não me admira que os números sejam bem maiores do que os indicados em pesquisas. É constrangedor assumir a própria infelicidade (lembrando que tristeza e depressão são duas coisas diferentes, é claro) quando as coisas estão caminhando exatamente como planejamos. Ou como fomos induzidos a planejar através de um conjunto de expectativas despejadas sobre nós. É aquele lance de você falar que não está feliz e te perguntarem o motivo, indagando se tudo o que você queria não estaria acontecendo. E aí ou você começa a se sentir como o cara que reclama de barriga cheia e engole os problemas, seguindo com uma vida que não deveria ser a sua, ou você faz a pergunta que precisa ser feita: “queria mesmo?”.

Acredito que o primeiro passo para se tornar um indivíduo mais feliz é recuperar a autonomia plena sobre a própria vida. Não é fácil, mas, talvez ajude começar a pensar lá do ponto de partida o que te faria feliz de fato, desconsiderando todas as coisas que aconteceram no automático. Se questionar sobre as motivações de tudo que já fizemos pode ser fundamental para, no futuro, tomarmos decisões mais acertadas de acordo com as nossas reais necessidades. Às vezes, o motivo da infelicidade de alguém está, por exemplo, no fato de que a rotina de trabalho de oito horas por dia, cinco dias por semana não é para ela. Mas existe outra forma de pagar as contas? Existe outra forma de fazer absolutamente qualquer coisa, a gente só precisa se libertar dessa lobotomia social, sair da inércia condicionada e procurar nossas próprias rotas.

Desde muito cedo, nós aceitamos trilhar um caminho que já está ali. Pode não ser a fórmula infalível da felicidade, mas construir nossa própria estrada enquanto vamos andando pode te ajudar a acordar pela manhã com um pouco mais de ânimo. Não é fácil começar do zero, não é fácil esbarrar em instituições que vão querer sabotar nossos reais sonhos, não é fácil batalhar, lutar, crescer na marra. Mas, convenhamos: existir é fácil, difícil mesmo é viver.

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