Do que é que você tem medo, Daniel me perguntou, e eu ri com um nervoso ímpar. Juntei meus dedos e movimentei os braços, constrangida. Ora, respondi, eu tenho medo de muitas coisas. Aranhas, por exemplo. Aranhas têm um efeito tão absurdo em mim que eu choro quando vejo uma, e esse pavor piorou quando eu descobri que algumas aranhas saltam. Saltam, cara. Imagina o que é isso? É tipo a natureza permitindo que os aracnídeos sacaneiem a humanidade. Sabe o que mais? Detesto palhaços. Não todos, diga-se de passagem, mas a maioria deles. Aquele palhaço do Stephen King habitou meus pesadelos por muito tempo, e por várias noites eu fiquei com medo de ver uma mão ossuda e um balãozinho vermelho escapando por debaixo dos longos edredons da minha cama e – agulhas! Já perdi a conta de quantas vezes estive para vomitar ou chorei quando precisei tirar sangue. Faço isso até hoje, e tenho vergonha de não ter qualquer controle nessas horas. É tanto medo, menino, mas tanto medo preso em um e sessenta e cinco de altura que fica até difícil te dar uma resposta curta.
Acho que você não entendeu, Daniel continuou, e se aproximou de mim. Eu quis dizer algo mais relacionado a… pessoas, sabe? Você não namora ninguém, não beija ninguém, mas está sempre aparentando furor e ânsia. Tenho a impressão de que você fantasia mais do que efetivamente realiza as suas pulsões – e por quê?
Acho que é culpa cristã, eu rio, mas não consigo me convencer de que tenho graça. Eu tenho medo, recomeço, de me apaixonar tão avassaladoramente que, bom, não sei? Não sei do que eu sou capaz quando amo muito alguém (ou a ideia que eu fiz desse alguém, tanto faz). Eu sou aquela que acorda com beijos, que leva comida na cama, que passa horas memorizando cores, curvas, cheiros, irregularidades deliciosas. Eu sou aquela que desenha poesia na pele do pescoço, pintando marcas de sangue prensado em qualquer espaço que me pareça convidativo. Eu sou quem releva, quem entende, quem engole gritos para não chatear além da conta – e eu entro em conflito comigo mesma porque minha necessidade de satisfazer bate de frente com o meu gênio difícil e combativo e eu me torno uma metralhadora de palavras secas e declarações de amor. Eu sinto demais, isso me incomoda, e eu tenho pavor de ficar à mercê de qualquer um que seja.
Daniel me abraça, e eu não sei se é por ternura ou pena, mas sei que abraço de volta.