[Você pode ler este texto ao som de Shelter From The Storm] Chovia, mas no começo eu não me importei. Desci no Galeão e esperei a minha bagagem ser trazida pela esteira. A gente ouve por aí que todo mundo que passa algum tempo fora tem problemas para se adaptar quando volta, e eu tinha passado algum tempo fora de mim mas achava que agora as coisas se acertariam. Acertei, mas demorou um pouco.
Fechei todas as janelas porque o tempo não melhorava, pelo contrário. Eu não sabia o que fazer com os presentes que não tive como te entregar e nem com a saudade que sentia de você. Eu, que nunca gostei de doce, me peguei botando açúcar no café porque precisava compensar o gosto da nossa última briga. O tempo piorava, a chuva aumentava.
Trabalhar e estudar me faziam ter dias cheios numa vida vazia. Eu ainda esperava me acostumar e até tive uma fase naquele aplicativo que facilitava conhecer garotas novas. Tentei algumas vezes, é verdade, mas desisti porque sempre voltava pra casa encharcado de dúvidas. Foi quando eu percebi, outras garotas, guarda-chuvas e janelas fechadas: nada disso importava, porque a tempestade estava aqui dentro.
Quando você não está aqui, eu chovo. E choveu todos os esses dias que eu me perdi tentando não achar você.
Eu não saberia te dizer de onde tirei a coragem pra ir conversar com você depois de tanto tempo, mas tenho certeza de que foi a minha decisão mais acertada desde que resolvi sair de casa pra conhecer você. Pela primeira vez em muito tempo, eu abri as janelas e percebi, voltando a sorrir, que tempestade agora não passava de uma garoa.
Eu não moro na Avenida das Américas, e era lá que estávamos hoje, um ano e meio depois que eu desci no Galeão e esperei a minha bagagem ser trazida pela esteira. Você selou os lábios nos meus e eu finalmente estava em casa.
A chuva passou.
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