Acordei atrasada outra vez. Pulei da cama arrancando a roupa e corri para o banho. Não havia tempo para o café, mas eu sabia que seria atormentada por horas de mau humor se não bebesse um gole do meu elixir.
Coloquei Elvis para tocar enquanto penteava o cabelo e aguardava a água ferver. (Espero que minha mãe não leia isso. Ela odiaria saber que escovo o cabelo no meio da cozinha.)
Elvis cantava, a água fervia e eu fazia um rabo de cavalo sem graça quando me peguei pensando em você. A música não tinha nada a ver com a gente, mas também não temos nada a ver um com o outro e isso nunca nos impediu de tentar.
Quer dizer, eu tentei. Tentei desesperadamente, como quem fica com a mão dormente depois de murros e mais murros em ponta de faca.
Cheguei a procurar um chip sob a pele. O que foi que você fez comigo para passear assim pela minha cabeça?
A gente não fala a mesma língua e ainda que o encontro da minha língua com a sua tenha gosto de céu, o minuto seguinte costuma ser aterrador como o inferno.
É por isso que não quero te ver nunca mais. Quietinho, Elvis! Deus me livre da sua voz me fazendo pensar nesse cara.
Eu brigava com a sua lembrança, a água borbulhava, a escova repousava e o tempo continuava passando. Esqueci do café e do relógio enquanto desenhava sua imagem mentalmente e procurava me convencer dos seus defeitos. Um trabalhão, diga-se de passagem!
Pode tirar o cavalinho branco da chuva, benzinho! Não é porque lembrei de você enquanto o filho da puta do Elvis cantava que vou me render aos seus encantos.
We’re caught in a trap, meu caro.