Conta pra ele que na terça-feira passada eu não dormi por sua causa.
Conta que eu deitei de jeans, subi na cama de sapatos e me prendi em você. Que tava com seu cheiro nas mãos, no ombro, na camiseta e queria que ele se propagasse pelo quarto. Que pedi o nome do perfume pra comprar e deixar na cabeceira, pra tentar sanar minha gana de sentir você no mesmo espaço que eu.
Eu só me lembro que era noite já, tava frio, a fila da boate tava insuportável e você apareceu na porta no exato momento em que eu pedi três caipirinhas diferentes e a música começou a tocar. Você tava com ele, passou por perto com ele, subiu as escadas com ele – e manteve o olhar em mim. Por que você era dele e não meu? Porque as coisas não funcionam assim e cada um tem o seu paraíso particular, jurei pra mim. Jurei que não tava perdido, que tava tudo bem, que essas coisas que balançam a gente geralmente se prolongam e não ia ser uma camisa xadrez ou o modo como você me descobria que iria mudar as coisas.
Conta pra ele que duas semanas depois você me diria – trancado num quarto mal iluminado e deitado no meu peito – que eu era a sua maior história de amor não-realizada. E eu pensava, não falava, segurava o nó na garganta pra não te sujar com a minha instabilidade, pra não te dizer que eu tava me apaixonando, que as coisas já tinham desandado, que agora eu te levava pra passear comigo numa montanha-russa sentimental e que as travas da cadeira não tavam funcionando direito. Não te diria que eu reparo no jeito que o cabelo cai nos seus olhos e em como você tem o abraço mais regulável do mundo, que não se importa se eu visto M ou G, que não liga pra minha falta de memória, que acorda todo dia com um bom dia meu.
E conta pra ele que a playlist do meu iPod segue uma lógica pouco seletiva de canções que têm você como ritmo, ditando todo aquele ressoar pomposo que o meu peito faz quando cê tá por perto. Conta e tenta explicar aquela coisa dos teus lábios curvados num sorriso de lado, a expressão de surpresa, a sua cara de reprovação e a cabeça baixa deitada no meu ombro enquanto canta baixinho “now I’ve got you in my space/ I won’t let go of you” e não deixa mesmo, me segura entre os dedos porque eu tenho uma mania feia e fácil de escapar.
Conta pra ele que você conheceu alguém novo e que alguma coisa aconteceu às 5h30 da manhã de uma quarta-feira, mesmo você não tendo encostado a sua boca em mim, mesmo a gente tendo sobrevivido de abraços, boa noite e dorme bem. Explica como fica pausada-a-sua-respiração-em-fragmentos-detectíveis-e-como-todo-mundo-em-todo-lugar-repara-na-gente-junto. Conta que eu escrevo sobre você, que me lembro de você em cada curva que faço ou em cada estação de rádio que o carona do meu carro deixa parar. Conta que eu ando sonhando em como vai ser daqui pra frente porque a minha cabeça tá fudida, meu coração tá pesando, eu não sei o que eu tô fazendo, mas só sei que isso é bom. E como pode ser tão errado se você me faz feliz desde o dia em que sorriu pra mim?
Conta pra ele, baixinho, diz algo assim: “amor, eu não sei o que aconteceu, eu nem sei direito o que eu tô sentindo, mas ele me empurrou de um precipício e agora eu tô caindo em queda livre junto dele”. Diz que encontrou alguém novo, que precisa ir embora e que a culpa não é dele. Se despede de cabeça baixa e não surta, me liga se for dia ou se for chuva, me manda um recado pra ir te buscar e te dizer que eu tenho certeza de nada ou que vou finalmente sumir e te deixar livre de mim. Mas antes disso, conta pra ele que me ama. Ou acaba com isso logo e conta pra mim.