Toque dele


[Você pode ler este texto ao som de “Lost Without You – Robin Thicke”]

Chico, o meu amor tem um jeito denso que é só dele. Desses que a gente afunda e se perde e fica se perguntando como é que a gente foi se enfiar ali – mas eu nem penso em como sair. O jeito dele de soprar as coisas no meu ouvido, dum jeito que eu já me desfaço feito dente de leão e vou indo, assim leve feito brisa como a Clarice falou noutro dia. O meu amor tem um corpo que é só dele. E que se encaixa tão bem que no começo a gente dava choque, daqueles choques que a gente sente quando sabe que é o nosso amor e pronto.

E me faz um bem que ele mal sabe. Ou sabe bem e faz por isso.

O meu amor tem umas sobrancelhas semicerradas e uma expressão constante de quem desconfia de mim. Desconfia dos meus movimentos de quem tá pronta pra atacar – e ele morre de medo de cócegas. Parece criança pequena quando deita e dorme, no jeito dele que é tão dele que nenhum outro tem, mesmo com aquela coisa de que todo homem é igual quando dorme e tá doente. Espalhafatoso e fala baixo, Chico. E o tal do jeito manso aparece quando ele levanta os olhos pra me encarar por qualquer besteira. O cheiro dele também é forte. Tem suor e uma essência que eu adoro. E ele usa isso pra fazer charme. Ele não tem barba, mas quando cola o rosto no meu… Ah, eu sinto um arrepio, sabe? Ele me chama de minha menina e eu fico feliz por não precisar ter que ser mulher com ele. Já aguento demais lá fora e vez ou outra é bom poder chorar e ser frágil com alguém que não vai te mandar engolir o choro e encarar o mundo.

Se o mundo caísse agora, ele me abraçaria tão apertado que eu nem ia me sentir em queda livre. Com ele eu desabo e nunca caio, Chico.

Dia desses tava meio difícil porque eu viajo por Saturno e ele fica em Marte, como sempre. E ele não faz perguntas, Chico. Ele afirma. Ele afirma que vai ficar tudo bem e me diz se tem como não acreditar em alguém que te sorri com os olhos? Os braços do meu amor nem são tão fortes, nem são tão fracos, mas são dele. E dele é que chegam as coisas boas. As coisas se iluminam sempre que ele faz isso e daí que eu percebo que o que eu gosto nele não é só o toque dele. É desse jeito denso, cuidadoso, que me invade sem pedir licença, mas traz flores. É dessa coisa que me entende sem perguntar demais porque ele não gosta de discutir relação. Ele prefere ponderar e pondera tanto que eu já teria surtado se fosse ele. Chico, ele ama os meus amigos porque eles me fazem feliz. Ele ama uns dias ensolarados porque eu posso correr e isso me deixa feliz, mesmo que ele odeia ter que sair da cama às 6h pra me acompanhar.

O meu amor faz parte dos meus segredos. E viola os meus ouvidos com a sutileza de um furacão. Ele não me trata como presa, Chico. A nossa conquista é diária e ele me liga pra me dizer que se lembrou de mim. Você sabe o valor disso, não sabe? É o jeito brando dele que é só dele. E cada parte da parede do nosso quarto tem um pouco da gente e um pouco de música. Pra gente viver com som e melodia até no silêncio. Ele me conduz com maestria, Chico. Sabe onde tocar e ama o meu corpo mesmo que não seja nenhuma capa de revista. Mesmo que tenha que lidar com as alterações da TPM e ele me ama até quando eu tô inchada. Quando esperneio e digo trocentas vezes pra fechar a porta. Pra ir embora. Pra me deixar pra lá porque eu sou muito chata e tudo mais.

Ainda bem que ele vai na hora. Mas nunca vai mesmo embora.

Ele volta e diz que eu também sou o amor dele, Chico.

E daí eu vejo que não é só pelo toque dele de novo. É por ele todo. Principalmente quando ele me sorri com os olhos e fica tudo bem.

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