Esse ar de tristeza é a sua identidade. A chave da porta da frente da alma. É como se uma bolha invisível tomasse conta e dissesse pra ele “você não pode e nem deve sair daqui”. É essa a realidade das noites com seu travesseiro. Descansa a cabeça, mas desatina a pensar. Bomba-relógio. Sou eu explodindo pro mundo ou o mundo que não cabe em mim? Ele se pergunta sobre isso todos os dias. Sobre quando essa agonia vai ter fim e alguma coisa vai indicar que a caminhada acabou. E sempre acaba chegando à conclusão de que o importante é a caminhada e que essa sensação não vai passar nunca. Como um bom amigo, essa melancolia estende a mão e o convida para um café. Não se deixa levar pelas modas das revistas, nem pelos anúncios na TV. É atemporal, do século passado, uma tremenda contradição. Se desenrola em tons pastéis e parece ser a única coisa que o entende. Que o atende. Que o entendia. Que o deixa ser.
Aquela fotografia de algum tempo atrás marca um auto-retrato de alguém que ele não conhece. O espelho diz uma coisa. As pessoas na rua dizem outra. O registro fotográfico denuncia um terceiro sujeito. Acho difícil mesmo é que um dos três, seja qual for o real, carregue em si essa força tão grande. Essa força que parece forca e sufoca o sorriso. Que faz doer sem precisar apelar para o tato. Que pede um berro e é silenciado pela falta de voz. Essa melancolia o alegra e dá algum sentido a ele. Ou, pelo menos, faz achar que tem algum sentido. Não sabe em que rua se perdeu. Em que rua o jovem garoto de barba grande e cabelos ao vento entregou sua rebeldia ao diabo e se fez sofredor. Ainda apostam que ele perdeu algo no caminho e se desesperou. Eu aposto na causa natural da vida. Ele é desses rapazes completamente insatisfeitos com a vida que tem e com a vida que pode ter. Mas tem sede de viver e de abraçar o mundo. E é justamente isso que faz doer.
E quantas vezes você já racionalizou o mundo? Já relativizou a existência como um simples ponto no meio do mapa. Já se perdeu nos Andes e se encontrou numa cidade qualquer a oeste do Pacífico. Já navegou por alguns mares e se perdeu em terras desconhecidas. É só fechar os olhos. Tudo deixa de ser e retorna ao ponto de partida. Se ninguém acender as luzes, quem é que vai saber para onde ir?
Não é nada. E nada. Nem ninguém.
Nenhum deles pode explicar essa angústia silenciosa de quem sofre sem razão. Nem a própria razão consegue desvendar os segredos desse cofre guardado no peito. Rasga a pele e traz para mais perto o que imagina que seja o motivo. Mas o velho amigo ainda está lá, com uma expressão triste e falseada no rosto. É como se ele soubesse que, no fim das contas, se questionar demais é admitir a tristeza. Ser feliz é se enganar. Fechar os olhos para o mundo, calar essa inquietação de quem procura algum destino e abrir o peito para jornada. A busca justifica a vida. E ainda sobra a esperança.
Mês que vem vai ser melhor. Talvez ele acorde e alguma revolução se faça no seu mundo. Talvez as cortinas acordem pintadas de outra cor e brote um motivo qualquer que o faça feliz. Talvez ele pare de questionar e comece a se responder. Talvez ele se explique e se resolva. Talvez ele deixe toda essa besteira pra lá. E você? A única certeza é de que alguma coisa um dia vai acontecer para mudar tudo isso. A única certeza. Ou a única esperança.