Crítica.


Eu tenho uma crítica ao seu novo livro. Você já foi melhor para falar sobre relacionamentos, sobre as coisas que nos movem, sobre tudo o que acontece na tua cabeça e você sente melhor que todo mundo. Hoje em dia eu te vejo cansada de tentar falar sobre amor, sobre paixão, sobre ter olhos abertos para o que o mundo inteiro não vê. Hoje em dia eu te vejo sem esperança, tentando corrigir a frustração de não ter encontrado um rumo na vida. Te vejo tentando corrigir as escolhas que você fez, catando os cacos de vidro dos mil espelhos que você destruiu. Te vejo tendo cuidado ao pisar em ovos, arriscando muito menos do que arriscava, escrevendo com um peso de pena nas mãos. Tua escrita deixou de ser leve e se tornou frágil. Você se deixou levar pelas mazelas da vida de todo artista. Você trocou as luzes da cidade pelo seu travesseiro. Esqueceu um pouco do que é sonhar e sofrer por isso, minimizou seus danos e erros, mas também recusou as recompensas que uma vida de inspiração poderia te trazer. Acho até que você envelheceu…

Você andou por muito tempo longe de tudo o que te fazia se sentir mal. Acho que se acostumou demais com a felicidade. E foi isso. Não que a felicidade te fizesse mal, mas ela te deixou mais maleável. Você já foi à prova de balas um dia, se lembra? Foi uma opção sua. A gente se desencontrou nesse meio tempo, mas eu sempre lia os teus livros. Livros sobre amor amado, sobre amor perdido, sobre amor que nunca aconteceu. Livros sobre amizade, sobre esperança, sobre vestígios de sentimentos, sobre todas aquelas coisas boas que a gente precisa que alguém escreva sobre. Livros de dar esperança, de contar histórias, de colocar criança pra dormir e muito adulto pra chorar. Livros que se acompanham com violão, com água de chuva, com o som das lágrimas. Livros que se adaptam aos sons do meu coração. E você também era assim, mas agora te vejo tão perdida e tão jovem.

Essas novas páginas que você escreveu são páginas em branco. Elas falam de coisas bonitas, mas você não acredita mais nelas. Serviria de algo falar de amor para quem nunca sentiu isso? Não é palpável, não vem com cheiro de lembrança triste ou feliz. Vem com um ar meio vazio, mesmo que você saiba muito bem como colocar floreios nas tuas expressões. Eu encontrei tuas palavras há muito tempo atrás, quando elas ainda me tocavam feito sol quente. E nelas eu encontrei sentido e peso; orgulho e riqueza; sorriso e uma tristeza ímpar capaz de causar comoção até ao maior ogro de todos os tempos. Eu deixei as tuas palavras guardadas em cima da minha cabeceira. E não é que a janela estava aberta e elas voaram pra fora? Não tive como correr atrás delas porque você trancou a porta e não deixou as chaves. E não dava mais para eu tentar me refazer com novas palavras, com as novas metáforas, com os novos sorrisos que você escrevia de longe nos seus livros. Eles não falavam mais sobre mim. Agora era sobre uma outra história qualquer que batia na porta antes de entrar e te mandava flores no outono dessas estações da vida. A dedicatória não tinha mais meu nome e nem suas palavras se encaixavam em mim. Achei que era um modo de você tentar me consertar com essa nova história, mas estava errado. Era um modo de mostrar que achou seu novo lar, seu novo recanto linguístico, seu novo vocabulário.

Minha crítica é sobre você. Sobre as coisas que você tem vivido sem a minha companhia. Minha crítica é segura e imparcial. E eu não consigo acreditar em mais uma palavra de amor que você escreva nessas novas páginas. Como é que você vai falar de amor sem mencionar nós dois?

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