Assistindo ao mediano “Something Borrowed” com a maravilhosa Kate Hudson, que um dia ainda há de descobrir que eu existo e me ligará para uma cerveja em Hamptons, pensei em quantas vezes uma amizade tinha se transformado em algo a mais pra mim. Não falo daquele interesse disfarçado que motiva o início da amizade por uma das partes que acredita que o outro nunca vai estar disponível para si. Falo sobre aquela relação de amizade que se descobre mais do que isso sem querer.
Imagine a cena: ele gosta de futebol americano e ela gosta da cerveja daquele Irish Pub da rua de trás. Eles se esbarram, se conhecem, se tornam grandes amigos falando sobre sabores de cervejas de diferentes nacionalidades. Tornaram-se melhores amigos. Todo mundo diz que eles têm tudo a ver e pode até ser que tenham, mas nunca admitiriam pra não estragar a amizade. Ou por não achar que o outro realmente ache isso. Ou pelo simples fato de nunca terem achado mesmo. E assim se passam anos. Ele avisa que vai casar e, de repente, ela percebe que ele até que é bonito. Ele vai apresentar a noiva e passa a noite fazendo comparações entre elas. Ela vai dormir e acha estranho o fato dele não ligar pra dizer boa noite enquanto ele vai dormir com a noiva sem entender direito aquele sentimento de não estar no sofá assistindo o jogo e comendo pipoca. Pois bem, o que fazer?
Eles se gostam. Eles se apaixonaram. Como isso aconteceu, meu Deus? Eles são uns monstros que gostam de adrenalina e descobriram apenas quando tudo estava quase perdido? Amigo, na verdade, aconteceu. Simples assim. Em todo tipo de relacionamento em que existe algum tipo de envolvimento emocional, penso eu, há a possibilidade de se atingir novos níveis. Ou seja, pra toda amizade existe alguma chance de que o interesse emocional se sobreponha. Não identifico o interesse físico como grande problema aqui, porque isso só os faria trocar alguns beijos e dormir juntos algumas vezes. O problema é quando você se descobre apaixonado por aquela sua amiga de escola que já namorou o seu melhor amigo porque você deu a maior força.
Esse tipo de situação desperta em nós uma vasta gama de sentimentos. Insegurança, medo, negação, confusão e por aí vai. Parece óbvio que todo ser humano afetivamente bem resolvido tomaria como decisão um diálogo. Mas creio que todos nós já pensamos duas ou muitas vezes antes de escolher falar abertamente sobre esse novo “sentimento”. Ou nunca falamos porque sabemos quão apaixonada ela é por aquele judeu barbudo. Ou porque ela falou mil vezes que o tipo físico dela é um grandalhão cheio de músculos que luta boxe e ouve heavy metal e você tem a certeza de que esse nunca seria você. E começamos a julgar como seria o desenrolar disso tudo. Quais seriam as conseqüências além das opções de ter a amizade abalada, de gerar um desconforto entre eles, de não dar certo e eles se perderem por aí entre os escombros disso tudo.
O problema é que a maioria de nós segue o clichê das comédias românticas nesse tipo de situação. A gente espera, disfarça, ignora, finge que não é com a gente. E quando não dá mais, a gente desaba com toda a verdade em cima do outro, seja por não agüentar mais ou por aquela bebedeira infernal de Cuba Libre na despedida de solteiro de algum amigo. E as comédias românticas comprovam que esse tipo de assunto não é pior com os adolescentes confusos que não sabem o que querem da vida. Nah, isso é moleza e facilmente resolvido depois de um tempo. Pior é quando se perde aquela flexibilidade da juventude de dizer o que se quer e voltar atrás um minuto depois com um pedido de desculpas. Daí vem a parte em que os clichês não servem mais: os finais são diferentes. As comédias foram feitas pra deixar tudo certo no final. Mas nos relacionamentos reais o fato de não se arriscar na hora certa ou não se arriscar de verdade pode fazer com que tudo realmente não funcione. E, pensando bem, é melhor ser rejeitado com um sorriso e um abraço da sua melhor amiga do que passar a vida pensando em como teria sido se ela soubesse, e descobrir que ela sentia o mesmo. Mas agora vocês já estão perdidos demais pra se achar e longe demais pra voltar atrás. E aqui o clichê é contrariado: algumas vezes é tarde demais, sim.