Desculpa, mas a gente não acaba aqui


Teve uma época que eu te prometi tanta coisa, te prometi que seguiria os planos que a gente combinou mesmo que isso aqui não desse certo e veja só como eu menti. Menti na tua cara um monte de coisas. Menti que tinha parado de usar cocaína, menti que tinha parado com o tabaco, menti que tinha parado de dar voltas no quarteirão em que tu morava, menti que não iria sentir nada quando você fosse embora, mentira pura na maior cara de pau do mundo só pra te ver menos preocupada comigo.

Eu tava preocupado contigo e com como o mundo ficaria sem você. Como é que eu iria ter que dar conta daquela peça faltando no quebra-cabeças e explicar pros outros que fica um buraco que não tem substituição. Fica um buraco gritante no meio de um mosaico bonito de dez mil pedacinhos que escondem o que eles são. São cacos encaixados na tentativa de formar alguma coisa que não faz sentido se não tiver você.

Eu não tava preocupado em contar pro Amadeu que teu cachorro iria passar a morar lá em casa e que a mobília seria doada. Que não iria ter mais cafezinho quente na portaria às seis da tarde. Que ele não precisaria mais se preocupar com o interfone de madrugada, já que você era a única moradora do prédio que chegava embriagada às quatro da manhã de uma quinta-feira por minha culpa. Eu não tava preocupado em contar pras tuas amigas da faculdade que você não seria mais madrinha de casamento da Ana e que não poderia ir ao chá de bebê da Roberta. Que a Telminha teria que começar a correr sozinha aos domingos. Que a Joana não ia conseguir pegar a receita de bolo da tua avó. Eu tava preocupado em aproveitar o tempo que eu tinha contigo aqui, porra.

De repente, a gente entende aquele ditado da vida breve. Noutro dia, subi num avião pensando no que aconteceria se ele caísse. Não teria as contas que eu me mato pra pagar. Não teria o aluguel ou a preocupação com a academia. Não teria as manias que eu tava tentando perder nem o analista de quinta-feira. Tu entende isso? De repente, a gente some. Um avião cai, um carro passa por cima, um órgão para de bater ou uma doença sem aviso bate à porta. Dizer que a vida é frágil é forte demais pro que ela é. A vida é um fio o tempo inteiro. E agora a tua tá acabando.

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Eu nunca vou saber se você seria o meu amor pra vida toda. Se você casaria comigo ou se a gente se odiaria lá pelos quarenta. Não vou saber se a gente teria carro, cachorro, bike ou um gato. Nem se o apartamento em Pinheiros continuaria tendo as paredes pintadas de azul. Não vou saber se a gente chegaria casar numa igreja ou pularia de bungee jump na Austrália. Você simplesmente tá sendo arrancada de mim sem nenhuma esperança de futuro. E são amores assim que permanecem eternos na mente da gente, independente dos que virão depois – e se virão. Porque eles ficam intocados no tempo. Adormecem dentro das feridas. Perdoam os erros, os vacilos e os palavrões atirados. Sobrevivem aos hospitais, às sessões de exames, às correrias pra limpar o sangue que sai pelo nariz. Sobrevivem às brigas bobas, às divisões de contas, a tudo que a gente julgou importante um dia.

Quando é só falta que sobra, tudo o que não é a sua presença passa a não ter valor. Passa a ser corriqueiro, cotidiano até. E todo e qualquer momento em que a lembrança de você por perto for colorida fica.

Foi por isso que eu menti. Eu tava preocupado contigo e com como o mundo ficaria sem você. Tava preocupado em como é que eu lidaria com o mundo sem você. E queria te ver menos preocupada. Sei que tu me pediu perdão por tudo estar acabando desse jeito e por querer me deixar antes de ir embora pra eu não te ver sofrer, e eu disse que entendia, que tava tudo bem. Menti de novo. Amor, não dá pra te deixar assim. Desculpa, mas a gente não acaba aqui. Pra mim, você não vai acabar. Nunca.


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