[Você pode ler este texto ao som de All I Ask]
Ontem à noite estava pensando nele. Principalmente por ser uma noite chuvosa e fria, em que, pela distância ou pelo cinza do tempo, eu fico ainda mais para dentro. E pensar assim doeu um bocado porque fui percebendo, por dentro daquela chuva toda que caia lá fora, que mesmo em ruínas, ele ainda fazia parte das minhas lembranças.
E lembrei quando foi embora, sem entender muito bem o porquê. E me doeu um bocado mais. E pensei também naquela segunda-feira de sol quando disse que me amava e, subitamente, na terça-feira disse que não me amava mais e que estava tudo acabado. Em algumas madrugadas ainda acordo assustado te procurando na cama e julgando tudo ser um pesadelo. Mas o verdadeiro pesadelo é acordar e não te ver mais ao meu lado. Não sei até que parte eu te inventei ou você me inventou para passarmos os dias frios juntos. Mas assim que chegou a primavera, a estação do amor, quando a gente poderia ver as flores do ipê da esquina da Rua Vinicius de Moraes com a Epitácio Pessoa, você resolveu ir embora, meu bem. Mas não foi o único, nem o primeiro.
Depois de pensar nele, no menino do tambor, comecei a pensar neles. E então me veio à mente o menino da moda, que não parava um minuto de falar; falava tanto tanto tanto que sua última frase foi: “te amo, mas que não quero mais ficar contigo”. Depois pensei no menino que pintava quadros, que de tão inteligente soube a hora de partir, mas deixou em minha pele sua pintura. Depois pensei no menino que escrevia poesia, e a gente se comunicava assim: um sendo a rima do outro. Até que um dia, sem muito dizer, se foi; mas ainda hoje é verso. Depois pensei no menino de Copacabana, tão jovem e tão diferente que resolveu não ficar. E em seguida pensei no menino de ‘Essepe’, tão grande, tão bonito, tão risonho e feliz que no nosso último encontro meu sorriu e disse que sim, que sim, que queria me ver mais vezes, mas não demorou muito para sumir. Eu pensei em Thiagos, Alans, Camilos, Yuris, Thassios, Kenios. Pensei em Fernandas, Anas, Marias, Daniels, Brenos…
Quando já amanhecia, pensei também que talvez eu fosse muito grande e não coubesse em alguns espaços ou pessoas. É que, penso agora, tem gente que é maior que o mar. Enquanto tem alguns que não sabem o que é o mar – e amar. Pensei o quanto essas ruínas das memórias fizeram a pessoa que sou hoje; o quanto as chegadas e as partidas de todos eles me doeram uma existência inteirinha, mas igualmente me tornaram mais forte. Depois pensei que as pessoas falam coisas que nem sempre vão mostrar. Outras vão mostrar coisas que nunca vão dizer. Há aquelas que dizem sem sentir. E igualmente há os que sentem sem dizer.
É certo que a saudade às vezes aperta fundo no peito. Mas se não há nada a ser feito é porque absolutamente tudo já foi feito. Aí você pega a solidão e dança, com Adele cantando ao fundo e lágrimas descendo na face. Mas tá tudo bem, meu amor, tá tudo bem, porque se você foi embora ou não vem, eu te invento nas madrugadas frias.