[Você poder ler este texto ao som de Você Vai Lembrar de Mim]
Tu eras alguém que eu queria por perto, mesmo que fosse assim, de longe. O beijo era de cinema, o sexo impecável e as conversas poderiam durar duas vidas. Ainda assim teríamos bons causos para contar aos filhos que não tivemos. De relance, me perdia nos teus olhos, claros como geada, enquanto escutava tua voz me dizendo que nós formávamos um belo casal. Pouca roupa e sem vergonha nenhuma, sabíamos queimar nossos corpos num encaixe perfeito, entre as minhas coxas e os teus braços.
E como era bom aquilo, aquela sensação de calmaria, em meio a filmes ruins e o sofá apertado. Confesso que cheguei sem intenção de ficar, mas teu sorriso era convidativo demais para que a gente só trepasse e se despedisse. Uma xícara de café, depois um cigarro, e um Yakult pela manhã. Antes que eu te deixasse ali, planejando as próximas horas entre os teus compromissos e a academia. Eu descia do 14ª andar com os pés tão firmes quanto os de alguém que caminhava nas nuvens por acreditar que nós realmente iríamos nos tornar mais do que bons amigos.
Mas como toda boa história, a nossa não foi diferente. E só digo nossa porque eu realmente achava que daria em alguma coisa. Tu que começaste com aquele ”era uma vez…”, me deixando apenas com a parte de ser feliz para sempre sozinho.
Aos poucos, fui entendendo que mesmo com toda aquela química (e física) reunidas entre quatro paredes, talvez fosse apenas um gostar no sentido figurado. Tu vinhas, fazias cena, ias embora e eu ficava esperando a cortina fechar para bater palmas. Nunca aconteceu.
Não enalteci minha raiva e muito menos vangloriei meu ego por ter me negado qualquer fissura de arrependimento. Lentamente, definhei minhas expectativas, uma a uma, até que a certeza colocasse as mãos sobre os meus ombros e me mandasse tocar o barco:
– Pode ir meu filho, que desse mato não sai cachorro.
Teu porteiro diria que eu saí bufando rancor ou mal estar na última vez em que pisei no no teu prédio. Mas veja bem, eu não te queria mal, mas ainda te queria. Então sorri, respirei e segui em frente. Sem precisar enfrentar qualquer desejo que pudesse me fazer perder o sono depois, por ter sonhado acordado. Já não me importava mais se tu irias voltar para mim, pois eu já havia ido embora de nós.