Vai ficar em casa no feriadão?
Sem problemas: o ETC te indica quatro filmes que vão te fazer viajar sem levantar o rosto da tela (do PC, da TV ou do seu gadget favorito). Priorizamos quatro produções mais recentes, protótipos de cool ou já consagradas, que vão dar mil nós dentro do seu cérebro – um filme para cada dia, eu diria, mas não há doses seguras para essas substâncias: depois de ver qualquer um desses filmes, difícil mesmo vai ser voltar da viagem. Para ba-lancear o nó na cabeça, optamos por filmes com trilhas sonoras marcantes, tipo aquelas que você escolheria para ouvir no caminho, e por filmes de estética e planos bonitos, para compensar as paisagens que você não verá da janela lateral. Vamos lá:
Paprika, de Satoshi Kon (2006)
Não se deixe enganar pelas imagens coloridas: Paprika tem sua parcela de perturbação garantida pelo roteiro que envolve sonhos dentro dos sonhos dentro de nossos piores pesadelos (não assustaria saber que Christopher Nolan deu umas assistidas em Paprika antes de filmar seu Inception). Longa-metragem, anime, Paprika garante em sua hora e meia todas as idiossincrasias de uma produção japonesa: desde a dublagem empolgada de qualquer desenho da Tokyo TV, passando por personagens extremamente caricatos, à trilha sonora tirada do Froot Loops de um adolescente japonês viciado em joguinhos do 3DS. Acompanhando uma equipe de cientistas que criou uma máquina de compartilhar, gravar e, mais importante, implantar sonhos, Paprika subverte a maneira com que os personagens enxergam a realidade – colocando em risco a nossa percepção do roteiro: essa cena é real? Essa cena é de um sonho? Se sim, do sonho de quem? Não durma.
Enter the Void, de Gaspar Noé (2009)
O diretor argentino responsável por Irreversível, famigerado “filme mais polêmico do nosso século até agora”, anuncia nos primeiros minutos a proposta de Enter the Void, filme mais longo e complexo desta lista. Sob a ótica (literalmente) de Alex, o roteiro invoca o Livro Tibetano dos Mortos, que fala sobre a perspectiva da vida após a morte e lança em uma das primeiras falas: “dizem que a gente voa por aí depois que morre”. Bingo. Propondo uma imersão na consciência de seu personagem principal e tratando da ausência do corpo como percepção da realidade e memória humanas, Enter the Void extrapola: a apresentação dos créditos, no início, bem como a viagem de droga que o protagonista tem na meia hora inicial, é o mais próximo da experiência com ácido que você vai chegar sem necessariamente colocar ácido embaixo da língua. Cuidado com esse.
Another Earth, de Mike Cahill (2011)
Another Earth já diz a que veio em seu título. Um outro planeta Terra, exatamente como o nosso, está se aproximando lentamente de nós e, pior: lá moram… Nós mesmos. Não é só uma outra Terra – é um espelho. Há um outro você, um outro eu, vivendo lá a mesma vida que vivemos aqui… As mesmas lembranças, os mesmos amores, os mesmos sonhos, os mesmos erros que os seus. Ou será que não? Nada apocalíptico, o filme trata da busca de redenção da personagem principal – uma garota que, ao botar a cabeça para fora do carro para tentar enxergar a outra Terra, causa um acidente que matou uma mulher grávida e seu filho pequeno. Brincando com o próprio estilo, o filme é permeado por offs documentais que, junto aos belos planos abertos, tiram cada abstração possível da situação espelho-inter-planetária proposta. A roupagem meio crua meio indie, com a excelente trilha sonora do Fall On Your Sword, farão você pensar pra caramba. Pra caramba.
Snowpiercer, Joon-ho Bong (2013)
As aulas de história do ensino médio teriam sido mais divertidas – e eu teria entendido melhor a “Luta de Classes” – se tivesse assistido a este filme do diretor sul-coreano Joon-ho Bong. Diretor do maravilhoso e nonsense O Hospedeiro, Bong faz do mundo apocalíptico uma alegoria da luta de classes sociais. Após uma cagada homérica dos líderes da humanidade, ao lançar um produto químico na atmosfera para impedir o aquecimento global, o planeta é mergulhado num inverno eterno e os únicos sobreviventes são aqueles à bordo da Snowpiercer: uma locomotiva pique arca de Noé que dá a volta ao mundo em 365 dias. O filme começa quando os moradores dos vagões de trás decidem se rebelar e ganhar o controle do trem. Cada vagão, uma aventura sem retorno – sem checkpoint. Parece tolo, mas, se eu fosse você, assistiria hoje. O elenco é estelar: Chris Evans, Tilda Swanton, Jamie Bell, John Hurt… Bong produz algumas das mais criativas (e mais violentas) cenas de sua filmografia, como a da luta em total escuridão (“CHAN!, WE NEED FIRE!” me arrepia até hoje). Alegórico, o filme pode deixar um gostinho amargo na boca daqueles que procuram por menos metáforas. Ainda assim, melhor aventura e nó cerebral para o feriado.