Ele me abordou no meio de uma roda de amigas em um bar na Vila Madalena, me puxou pelo braço e disse: nossa, você é a mulher mais bonita deste lugar. E disse isso em alto e bom tom, na frente das outras meninas, o que as fez olhar com aquela cara de espanto incrédulo e dizer: óóóóó, que atitude. Porque o cara que é mané dá em cima de uma quietinho para, se levar um revés, já passar correndo pra próxima sem queimar o filme. Todas as mulheres estão cansadas, enojadas, extremamente fartas deste tipinho.
Uns olhos azuis nos quais eu mergulhei rapidamente, um corpo rígido por inteiro, um braço que me segurou com firmeza e não com aquela insegurança irritante de vai-não-vai. Destoava um pouco a cara de filhinho de mamãe criado a leite de cabra. Uma paixão? Dirigir em alta velocidade. Hashtag clichê. Muito mais novo do que eu. Muito poucas afinidades. Em menos de quinze minutos, descobrimos que eu e ele nunca daríamos em lugar nenhum. E isso deu uma vontade louca de ficar. Sabe aquela pressão de “ter que dar certo” já tirada dos ombros? Nós impreterivelmente daríamos errado. E com toda a pressão aliviada, rapidamente nos tornamos cúmplices no jogo da sedução: ninguém tinha mais que impressionar ou fazer um esforço tremendo para ser admirado. Então pudemos simplesmente aproveitar a presença um do outro e tirar proveito máximo daquele momento. Aquele momento era tudo o que tínhamos. Amanhã um ou outro poderia começar a namorar outra pessoa… Amanhã um ou outro poderia desencanar e ir buscar algo que pudesse dar em algum lugar… Amanhã um ou outro poderia apenas esquecer. E era essa iminência que tornava tudo tão interessante e vivo. Eu só ouvia a música no background, eu sentia o toque, eu bebericava o gin, ele me beijava e não fazia perguntas. A mente não estava no futuro, nem no passado. Só existia aquele momento.
Saber que não ia dar em nada era tão relaxante e excitante que nos vimos de novo, e de novo e de novo. E em nenhuma dessas vezes houve questionamento. Eu não perguntei por que ele demorou pra ligar e nem ele perguntou por que eu não pude sair pra jantar na última vez. Ele não tinha a menor ideia de quem eu era. Eu nem queria saber o que ele fazia. Riamos de besteiras, comentávamos a vida que se passava feito um filme em nossa frente, estávamos sempre simplesmente vivendo o agora. Nossas mensagens no whatsapp eram monossilábicas: Hoje? Sim. 8h? Ok. E assim era. Ele me buscava no aeroporto ao chegar em São Paulo, e abria a porta do carro bem fofo, os olhos azuis brilhando. Eu dizia todas as vezes que era assim que eu estava acostumada a ser tratada. Então ele aprendeu meus caprichos. Comprava espumante e deixava estar tinindo para quando eu chegasse, botava a minha playlist favorita, deixava a casa a meia luz. Ele trazia café na cama, me levava em casa antes de ir trabalhar. A despedida era um beijo não seguido por nenhum tipo de questão. Era um relacionamento livre, educado, prazeroso, desencanado e, ao mesmo tempo, passional. Praticamente o meu relacionamento dos sonhos. Mas se fosse efetivado, perderia o encanto, cairia em todas as armadilhas que nos impomos. E isso me fez pensar no quanto a gente complica o que poderia ser simples. Se a gente conseguisse destralhar o peso de nossas personalidades, neuroses e a densidade de nossas exigências, todo relacionamento seria só presença: dois corpos ocupando o mesmo lugar no espaço. Um momento de deleite, de dividir a vida e um curto espaço de tempo com outro ser humano. Um break de lindeza no drama em que somos protagonistas. Drama inútil.
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Nota do Editor: Alana não é só uma escritora de mão cheia que traz diálogos sobre o cotidiano. Ela também é uma mulher que decidiu buscar a vida dos seus sonhos recalculando sua rota e resolvendo que iria ser feliz a qualquer custo. Para isso, tornou-se uma nômade digital e busca a felicidade viajando o mundo. Lançou seu livro contando sua trajetória e dando dicas pra você que também vive procurando por algo que não sabe o que é ir atrás do que ama. Quer dar uma olhada no livro da Alana? Clica aqui.