Ele não existe


[Você pode ler este texto ao som de Sextape]

Ele tem mãos tão grandes que, quando me pega os pulsos, me faz sentir incrivelmente pequena. Existe uma diferença considerável de tamanho entre nós, isso eu não posso negar, mas aquelas mãos, eu garanto: quase não são humanas. Há um quê de fetiche na forma como os braços dele poderiam me manter tentativa – admito minhas inclinações e essa minha cabeça meio torpe –, mas o que mais me agrada é saber que o controle, desde o primeiro dia, sempre foi meu. Eu não sou prisioneira das vontades desse homem, mas ele se dá aos meus caprichos com uma satisfação das mais encantadoras.

Quando eu lhe peço que enrosque seus dedos compridos em meus cabelos, ele o faz num misto de ânsia e medo… Mas o faz. Nunca me negou qualquer pedido, e se eu disser mil vezes que está tudo bem, ainda o ouvirei sussurrar baixinho se eu tenho certeza, se eu quero, se eu ainda estou com ele ali – não, aqui.

Estou, meu moço, é claro que eu estou.

Ele tem unhas pequenas e quadradas que destoam da imensidão que é o seu corpo (e em qualquer outra pessoa isso poderia ser estranho, mas não nele). Há suavidade nas pontas dos seus dedos, e me esquenta o peito a forma como ele afaga o meu rosto e age como quem se deparou com uma agradável surpresa e precisa, necessita, anseia por demonstrar sua euforia. Eu retribuo sua empolgação com beijos na nuca sempre que o dia amanhece, e me sinto inflar de satisfação ao vislumbrar as equimoses que deixei na sua pele de oliva. Seus troféus, ele diz, e veste a camisa de gola alta, e ajeita a jaqueta, e arruma o cabelo. São meus, e eu não quero que ninguém os veja porque há qualquer coisa muito erótica em manter minha pose de homem sério quando minhas costas estão em carne viva e meu pescoço carrega o formato dos seus caninos.

Aquela explicação me liquidifica os joelhos. Há mágica naquela voz rouca e baixa e no sotaque que às vezes me impede de entender as palavras mais básicas – e embora vezenquando eu me incomode pela babilônia que são algumas das nossas conversas, eu entendo todo e cada suspiro que ele derrama sobre a minha pele quando estamos pressionados um contra o outro. Encontro paz nas palavras sem tradução que saem daquela boca apaixonante, e eu aceito tudo o que eu não entendo com entrega e gratidão.

Quando ele vai embora, eu me enrosco nos cobertores que são uma combinação de suor, perfume importado e milhões de histórias que eu ainda não escutei. Ele me encanta com sua origem meio desconhecida, com seus passos que não fazem barulho, com o fato de que uma hora dessas ele vai pegar de volta o voo para a Dinamarca – os bilhetes que encontrei debaixo da carteira dele me dizem que esse dia está cada vez mais próximo – e eu nunca mais saberei dele. Ele me encanta porque, no final das contas, não é mais do que uma ilusão gostosa com prazo de validade.

Juliana

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