Não tenho certeza se é pra ser


Eu só deixei o casaco em cima da cômoda durante a tarde e ela já chegou jogando tudo o que é meu para o alto. Vestiu-se para não sentir frio, pegou uma coberta para deitar com a cabeça no meu peito no sofá da sala. Queria um romance clichê meia boca, mas eu sou de ação, amor.

Disse que eu agia sempre como se o mundo fosse acabar amanhã. Ele vai. No dia seguinte também. Todos as noites um pouco mais, todas as manhãs não mais serão como foram as que existiram antes. Mesmo que a gente jure que seremos os mesmos e hábitos continuarão inteiramente iguais.

Coçou o canto da cabeça, apoiou uma das mãos sobre a bochecha e eu poderia jurar de pés juntos e joelhos no chão que morreria feliz vendo o modo com que o rosto se amaçou em si mesmo naquele instante. Quis morder, quis apertar, quis dobrar em mil e trezentos pedacinhos para caber na minha carteira. Só para poder levar onde fosse.

Falou que eu não precisava ter viajado apenas para vê-la, mas a gente nunca precisa mesmo. Só que existe uma diferença oceânica entre não precisar e querer deixar um pouco de si para traz para ser do outro. E é exatamente o que eu queria quando passei uma madrugada inteira de sexta-feira pesquisando preço de passagem.

Adormeceu um pouco depois. Revirou a cabeça umas três vezes enquanto passava os punhos fechados no canto face. Respirava calma enquanto o ar ultrapassava o tecido fino da minha camiseta batia contra o peito. Deixava um pouco de si escapar pelo canto dos olhos quando erguia um pouco mais a cabeça para ficar um pouco mais confortável em mim.

Deixei o filme terminar, esperei o tempo passar enquanto baixava os olhos e sorria. Sussurrei baixinho que a gente não precisa, não. Nem consegue dobrar o outro para levar consigo em algum lugar seguro que não brote saudade. Mas a gente tenta.

A gente sempre tenta encontrar um modo de ser feliz apesar de tudo.

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