Não é tão ruim assim


[Você pode ler este texto ao som de Hold You Tight]

Eu imagino a gente dançando no meio de um grande salão daqueles antigos, sabe? Como se eu te conhecesse hoje à noite e te puxasse pra dançar, mesmo que não saiba dar dois passos pro lado e pro outro sem ameaçar derrubar um prédio inteiro. Eu sou pior que uma catástrofe natural quando tento dançar, mas pra você eu faço o esforço de parecer o Ed Sheeran naquele clipe. Você dançaria comigo?

Imagino como seria a vida sem você daqui a algum tempo. Se ela ficaria sem graça ou se eu cairia na real que a gente não vive conto de fadas, que não tem salão antigo e o fim da noite se resume a nós dois andando meio bêbados no meio da rua, eu segurando o seu casaco, você reclamando do frio-calor-frio-calor que sente depois que bebe. Eu rio e te pergunto o que seria do mundo se a gente não tivesse se encontrado. Você não sabe, e eu adoro quando você não sabe alguma coisa porque você ri, você joga a cabeça pra trás e abre um sorriso cheio de dentes e batom vermelho, e eu quase te peço pra manchar a gola da minha camisa só pra chegar perto do meu pescoço e me deixar cheirando à colônia. Noutro dia perguntei pra uma vendedora se ela tinha o seu cheiro e ela disse que não. Nenhuma delas tem, meu bem. Só você.

A padaria fica na esquina e a sua casa é um pouco antes. Te deixo? Não, não me deixa. Você quer que eu vá contigo? Pra sempre, e pode deixar o meu casaco na portaria. Você não sente frio? Sinto, mas tem você. Te abraço? Me abraça e não me deixa escapar.

A gente chega cambaleando até a esquina, puxo uma cadeira e você desaba nela. Puxo uma na frente e sinto um bico do seu salto. Nada disso, aqui do lado. Sento e peço um pão na chapa, o que você quer? Você. Me devora? Devoro, mas traz uma xícara de café também, por favor? Ele traz, eu fico. E você se aproxima pra manchar a gola da minha camisa de batom, é aí que eu percebo que ele é cereja, não vermelho. E que os seus olhos são castanhos. E na pinta perto do nariz. E no mundo inteiro do teu rosto.

Por que você prende a respiração?

Eu?

É.

Acho que eu tenho medo de me afogar.

Em mim.

Em você.

E por que não se afoga?

Posso?

Bobo, é você quem usa bóias, não eu.

Não tem baile e a gente cambaleia ainda, numa coreografia engraçada que não tem glamour nenhum pra quem passa. A gente ri e se diverte como se uma orquestra tocasse a nossa música no meio da rua. Eu suado e você com a maquiagem borrada. Você borrando a minha gola, o meu pescoço e o meu lábio. Chega o garçom com meu pão na chapa e o seu café. A rua começa a encher. Eu te seguro forte e começo a afundar em você.

Não é o cenário perfeito pra uma história de amor, eu sei. Mas não é tão ruim assim.


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bovonew

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