[Você pode ler este texto ao som de Blow Me]
– Eu não sou fácil.
– E eu nunca disse que queria o que era fácil.
– Então é pelo desafio? Ou é por mim?
– Nem por um, nem por outro. Eu faço o que faço por mim. Faço desde que adotei pra mim mesmo essa nova medida maluca de enxergar o mundo.
– Como isso funciona?
– Não sei se consigo te explicar. Basicamente, decidi levar em consideração todo tipo de surpresa que o tal do destino colocasse na minha frente. É como se eu fosse o Jim Carrey naquele filme inconsequente dele. Só que eu apuro o que me interessa. E daí eu digo o meu “sim, senhor”.
– Isso quer dizer que você não se priva de mais nada? Quer dizer… Nada de se prender às velhas convicções de proteção e autopreservação?
– É que eu não sei descer ladeira com freio de mão puxado. Comigo funciona assim: eu sou intenso. E não adianta tentar detonar isso com o peso que o clichê possa trazer à sonoridade da frase. Eu sou exatamente assim. Eu não sei gostar de alguém sem me colocar de cabeça pra baixo, deixar cair tudo e me doar por inteiro. Se for pra ser só metade, eu prefiro nem ser. Amor é enfiar o dedo na garganta e botar tudo pra fora. Senão vira uma coisa qualquer.
– Ou seja, inconsequente. Arriscar assim pode te render algumas boas marcas na pele, alguns anos de terapia, uma boa cirrose e alguns livros tragicômicos que vão ficar na estante sem serem lidos pra sempre.
– O seu otimismo me encanta, sabia? Eu sei que isso tudo é casca. Bem, pelo menos eu espero que seja. Você não se envolve porque tem medo de profundidade. Você é rasa, meu bem. E não sabe jogar com a verdade ou com fatos bem construídos. A ironia é a sua arma de contra-ataque. Pena que ela não funcione comigo.
– E o meu sarcasmo funciona? E os meus estragos? Ou você também é imune a isso?
– Você é o caos em pessoa. Acho que teriam te roteirizado como uma dessas mocinhas-filhas-da-puta-vitimizadas de comédias não-românticas. Uma daquelas que aprontam bastante e no final conseguem um final feliz alternativo – porque vivem sob a alcunha de mocinhas intocáveis. Você merecia algum final que tivesse um quê de mim. Nem que a gente fosse parar no deserto do Saara. Sem água, sem casa. E você teria que me aturar de uma vez por todas. Talvez assim você descobrisse que toda essa sua ignorância afetiva tem um pouco de não saber o que é solidão.
– Uma daquelas suas Summers. Entendo… Você ainda romantiza tudo, meu bem. Mas desde quando a conversa é sobre mim?
– Desde que eu comecei a falar de mim. Quando eu falo de mim, você é o sobrenome. Ou o apelido. O assunto do corpo de e-mail. O título da dissertação. Sempre que vão falar de mim, tocam no seu nome de esbarrão ou de mansinho. De propósito ou por acaso. É que você ainda não aprendeu que precisa de mim pra muita coisa.
– E não pretendo aprender tão cedo. A sua insistência me incomoda. Fico feliz que você tenha encontrado uma linha de vida razoável que não te meta em encrencas sentimentais ou uma daquelas crises de bebedeira pra me ligar às 3h da manhã. Eu gosto de ver você assim. Mas não sei se eu tô disposta a mudar tanto por você. Mesmo que eu goste do que é nosso. De você e da gente.
– Eu não te pedi isso. Pedi pra se dar uma chance e tudo mais. E só.
– Mas pra mim isso é um mundo…
– Você é complicada demais.
– Já disse que eu não sou fácil.
– Eu sei.
– Então por que você quer ficar?
– Porque eu gosto de sofrer.
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