Tá acordada? Preciso te dizer algumas coisas


[Você pode ler este texto ao som de I Won’t Give Up]

No inicio dessa manhã eu acordei precisando de você, tateando tuas mãos no escuro, querendo que elas ainda trancassem meu peito como um cadeado que só você sabe abrir. Acordei meio que de sobressalto e, como esperado, você não estava aqui pra dizer que tive apenas mais um sonho ruim, que eu precisava mesmo de um senhor copo d’água e alguns minutos de massagem pra adormecer tranquilo e sonhar com a gente. No fundo, só precisava mesmo desse seu carinho meio sonolento meio preguiçoso, despretensioso embora sincero e das pontas mornas dos teus dedos passeando pelo meu rosto. Coloquei meus pés no chão – literalmente – e percebi que o curto percurso até a padaria seria completamente tedioso sem os teus passos copiando os meus escada abaixo e quarteirão acima. A moça do caixa vai me perguntar de você, então já tenho preparada uma mentira qualquer sobre sua pós e muito trabalho, pronta pra escapar dos meus lábios, numa tentativa frustrada de me convencer do fato que você está fora do alcance dos meus braços e que querer você não é o bastante pra lhe trazer de volta.

Depois de levantar, vi que a bagunça de minha cama era, de certa forma, incompleta sem aquela metade do teu corpo me cumprimentando com gentileza por fora do edredom, com atenção devidamente especial pro trecho de Yellow, do Coldplay, tatuado negro em contraste com a tua pele clara (que me faz sentar no chão bem à sua frente e assumir a postura de admirador-babão do seu sono de menina por uns bons três quartos de hora) me convidando descaradamente pr’uns beijos bem dos safados. Sim, porque contigo tudo fica em seu devido lugar, inclusive toda e qualquer desordem; porque contigo cada manhã de segunda começa como uma madrugada de sábado pra domingo, cheia de paz e preguiça e aquela vontade louca de fazer amor logo cedo, pois, independente do compromisso marcado pras horas seguintes nosso romance-matinal-cotidiano sempre pode ser prorrogado por mais cinco minutos. Função soneca mais perfeita do que essa nunca existiu e devo admitir que sinto falta de acordar atrasado e perder um dia ou dois de trabalho. Contigo, ser irresponsável pra algumas coisas tem um gosto até bom.

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Só queria que você soubesse que – mais uma vez – acordei querendo dormir ao seu lado; ou pelo menos, te vendo dormir aqui no meu canto da cama, roubando meu travesseiro, respirando em modo automático, serena e numa meiguice de fazer inveja, com as mãos em concha embaixo do rosto. Ou acordada também, reclamando do quão folgado eu sou por lhe deixar descoberta a noite toda e do quanto você odeia a sua pele arrepiada pelo vento frio que sopra pela janela e do ventilador de teto ligado.

Que não se aconchegue demais e vá embora sem deixar rastros esse lance estranho que me invade ao olhar pra nossa cama vazia;  tão estranho e cruel quanto os vários obstáculos quilométricos que vão se intercalando entre nossas expectativas-realidade ao longo dos meses sem nenhum tipo de cerimônia. Que não faça hora extra esse momento ‘sem-você-deitada-no-meu-ombro’ que insiste teimoso em várias madrugadas de insônia e sonhos irrequietos, soletrando cuidadosamente (num sorriso sacana que só ele tem) que o sossego tarda e as vezes falha sim. Que esse infeliz acaso pare de me descobrir, me deixando ao relento da tua ausência. Que você entre por aquela porta vestida com a minha blusa, repetindo docemente que nem nos seus melhores sonhos tu imaginava me encontrar, tão bem dito e bendito, me acordando de qualquer sonho bom ou ruim e trazendo boas doses de realidade, carinho e daquele café gostoso que só você sabe fazer.

Silvio

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