Procura-se tradutor pra entender as atitudes do crush


Sabe, quando comecei minha trajetória no que hoje chamo carinhosamente de “Vida Amorosa” a gente tinha pouquíssimas formas de se comunicar com o que hoje chamamos nada carinhosamente de “Crush”.

Um Baby da Telesp celular, ICQ após as 0h e um telefone fixo que poderia ser interceptado por membros da família. Nenhuns dos três meios tinham tantos recursos audiovisuais como os que temos hoje. Então não havia a possibilidade de alguém interpretar errado algo do tipo:

– Vamos ao cinema amanhã às 15h?
– Sim. Te espero na frente do Playland. Dou um toque do telefone de casa antes de sair porque estou sem crédito no celular.

Pensando nisso, acho que as coisas começaram a dar errado no Brasil depois que o MSN substituiu o ICQ e possibilitou mandarmos indiretas com frases toscas no status ou músicas que estávamos ouvindo. E desde então, essa conversa simples aqui de cima foi se transformando, até virar o que seria hoje: uma troca de mensagens de dois dias no Whatsapp com emoticons misteriosos + envios inbox no Instagram de posters de filmes aleatórios + gifs da Gretchen para representar a sua expressão + insira aqui outros recursos que a gente utiliza para complicar uma comunicação que deveria ser simples, clara e direta.

E ainda tem um plus! Todas essas conversas são avaliadas print após print pelo seu grupo de amigos que tenta traduzir minunciosamente cada uma delas.

Quem nunca?

Por isso proponho aqui duas soluções para esse problema que assola nossa geração.

A primeira é: vamos criar um dicionário colaborativo Crushês / Português para frases, emoticons e comportamentos digitais, abrangendo questões como:

– Ontem ele/a mandou a carinha de beijo com coração. Hoje mandou só a de beijo. O que isso significa?
– Se me mandar uma música eu devo interpretar como recado? Se sim, levo em consideração a letra ou a melodia? E se a música for em inglês?
– Curtir minha confirmação de presença em um evento no Facebook significa “querer ir junto” ou “que bom que você está fazendo coisas sem mim”?
– Se ficar online no Whatsapp e não visualizar minha mensagem é por que está conversando com gente mais interessante do que eu?
– O que é mais intenso: dar um – Curtir três posts seguidos no Facebook é o mesmo que “gosto de tudo o que você diz e quero que você saiba disso” ou só “eu curtiria um só, mas você posta muito e preciso me mostrar presente”?
– Ficar uma semana sem falar comigo e me marcar em uma publicação da página “Ajudar o povo de humanas a fazer miçangas” é uma forma de retomar contato ou só um desvio de caráter mesmo?
– Se comentar minha selfie no Facebook com um – Quantas horas depois de te ver a pessoa tem que mandar “gostei de te ver” pra que a frase seja genuinamente verdadeira?
– Como saber se um textão de indireta finalizado com #ficaadica foi para mim?

Imagino que depois dessas questões, temos aqui dois grupos de pessoas. Um que se identificou com 99% das situações acima e outro que não consegue parar de pensar em como a mente humana pode ser capaz de pensar em coisas desse tipo.

Aos dois, apresento a segunda solução para nossos dilemas de comunicação contemporâneos: parem de tentar traduzir emoticons e aceitem que uma carinha feliz é – e sempre deverá ser – APENAS UMA CARINHA FELIZ.

E ao invés de fazer o Xerox Holmes e passar horas da sua vida tentando desvendar o comportamento alheio, pense apenas no que esse comportamento causa em você e como isso pode ser melhorado. EM VOCÊ. A única pessoa que VOCÊ realmente tem o poder de entender e de mudar.

É fácil? Claro que não! Mas ninguém disse que a vida adulta seria e você deveria se dar conta disso cada vez que paga um boleto diferente.

Brincadeiras à parte, espero que todos que chegaram até aqui considerem válida somente a segunda opção e entendam que, quanto mais tentarmos descobrir o que o outro diz nas entrelinhas, mais energia vamos gastar com aquilo que não somos capazes de compreender. Ao invés disso, direcione essa energia e o tempo gasto com isso para conhecer a si mesmo, como já dizia Sócrates.

E toda vez que se esquecer disso, lembre-se de que, se uma pessoa é capaz de começar um texto falando “crush”, citar Gretchen e finalizá-lo com uma citação de Sócrates, significa que a mente humana é complexa o suficiente para que nenhum de nós tente descobrir o que alguém pensa ou deixa de pensar. Melhor focar em entender que cada um tem uma história e uma motivação para fazer o que faz e pensar em um jeito de lidar melhor com o que resulta disso.

Fechou?

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